SOBRE A ORAÇÃO DO CORAÇÃO
"EXPLORANDO O UNIVERSO INTERIOR"
ENTREVISTA COM O PADRE ROMAN BRAGA
tradução de monja Rebeca (Pereira)
Padre, o senhor disse antes que o Padre Teodósio praticava o hesicasmo. O senhor aprendeu a Oração de Jesus com ele?
Não. Ele nunca me falou sobre a Oração de Jesus. Aprendi a fórmula com o diretor do seminário, o Arquimandrita Chezarie Paunescu, que mais tarde se tornou bispo de Galatsi. Outro grande monge, ele era professor de latim e grego, idiomas e culturas. Ele era muito severo e correto, quase legalista. Tinhas que cumprir tuas obrigações e ler tuas orações mesmo que não entendesses nada. Ele costumava dizer: "O ascetismo é algo a ser praticado. A oração é muito importante, mesmo que a digas mecanicamente, porque a compreensão vem depois. O Espírito Santo trabalha em ti mais tarde, depois que estiveres bem estabelecido em teus esforços ascéticos." Esse era o método dele. Ele me disse para recitar a Oração de Jesus se eu não sentisse a presença de Deus. Na minha opinião, ele foi um grande pedagogo sem ser pedante.
Mas o senhor não aprendeu com ele a Oração do Coração?
Sim e não. Costumávamos perguntar-lhe a sobre a Oração de Jesus, e ele dizia: "Não me teste. Por um tempo, basta recitá-la sempre que puder." Foi tudo o que aprendi com ele. Eu não sabia nada sobre os métodos de recitar a Oração até muito mais tarde, quando li os Santos Padres, e descobri que essa oração simples não é tão simples assim; é necessário um método especial, e há toda uma teologia nela baseada na existência de Deus em teu coração. Mais tarde, em minhas leituras no Instituto Teológico, descobri o que é a Sagrada Liturgia Interior. Com os monges, aprendi que é uma oração como qualquer outra. Eu costumava vê-los andando e movendo os lábios.
Padre, o senhor acha que o esforço ascético associado à Oração do Coração deve ser o mesmo para monges e leigos?
O primeiro passo deve ser a Oração, ou seja, a fórmula. Se recitares repetidamente a Oração de Jesus, o resto vem naturalmente. O homem não pode se tornar desapaixonado sem cair de joelhos e pedir a Deus por essa graça, porque tudo vem pela graça de Deus. Alcançar o desapego não é resultado de esforço pessoal, mas vem pela graça de Deus; portanto, deves cair de joelhos, reconhecer-te como pecador e pedir a ajuda de Deus. A oração e a purificação das paixões acontecem ao mesmo tempo. Acho que a prioridade deve ser dada à oração. Diz-se que não há oração pura sem primeiro alcançar o desapego. Mas eu digo que, seja oração pura ou oração forçada, a oração deve ser o começo de qualquer trabalho espiritual.
Padre, vamos retomar o fio da sua biografia, onde começamos a divagar. Então sua vida foi dividida entre o Instituto Teológico e o Movimento "Sarça Ardente"?
Para ser sincero, minha vida era em outro lugar. Eu ainda não era monge, mas me sentia atraído pela doçura de uma vida simples.
No entanto, o senhor desenvolveu uma nova compreensão do monaquismo quando aprendeu mais sobre a Oração do Coração?
Sim, agora o banco de oração que o Padre Teodósio do Mosteiro de Cernica usava, a leitura daqueles grandes volumes da biblioteca e o zumbido dos monges caminhando pelos caminhos do mosteiro faziam mais sentido para mim. Agora eu sabia o que eles estavam fazendo. Como não andavam nas alturas refinadas de São Gregório Sinaíta, não conseguiam expressar o que estavam fazendo. Sabe, muitas vezes é preciso que outros o interpretem.
Sou um daqueles que recebeu uma bênção especial do Padre João Kulegian. Há um ritual especial para iniciar a Oração do Coração; é como uma pequena ordenação. Ele colocou a mão na minha cabeça e me deu a bênção para praticar a Oração de Jesus. Na Sarça Ardente, costumávamos falar sobre técnicas de respiração ao recitar a Oração, mas eu não acho que isso tenha muita importância. Nem a bênção nem a respiração fazem mágica. Rejeitei os métodos porque os achei muito técnicos; eles não produziram nenhum resultado. Então comecei a rezar como o peregrino russo — mecanicamente — porque O Caminho do Peregrino estava em voga. Naquela época, era traduzido apenas para o francês, que era muito acessível aos romenos. Não havia consistência na minha oração; eu não tinha paciência. Eu fazia isso quando podia e quando tinha tempo. O que descobri é que, se estás muito preocupado com métodos, o Espírito desaparece. Pode ser que eu tenha sido muito influenciado pelos meus monges em Cernica. Quando o Padre Dionísio e o Padre Teodósio, o hesicasta, souberam do que a Sarça Ardente estava fazendo no Mosteiro de Antim, sorriram com indulgência, dizendo: "Veja bem, eles dão palestras sobre a Oração do Coração!" Era algo novo para eles. Como vocês podem dar palestras sobre oração? A oração é algo para ser praticado; não se fala sobre ela. Ela funciona misteriosamente. E por eles eu sei que um verdadeiro pai espiritual não confia a todos os seus discípulos esse tipo de oração. Ela deve ser cuidadosamente controlada. Então, eu estava preso entre dois mundos: um era o mundo da Sarça Ardente com o método russo de São Paísio Velichkovsky, uma espécie de democratização do hesicasmo que dizia que esta Oração deveria ser para todos; e o outro mundo, menos espetacular, mas creio que mais profundo — a atitude dos monges de Cernica.
No entanto, Padre, a "Sarça Ardente" constituiu um grande renascimento espiritual na rígida sociedade intelectual romena. Eu diria que o hesicasmo foi libertado do segredo dos mosteiros e entregue à sociedade em geral; todos precisam de salvação, todos devem se esforçar para praticar esta Oração.
Em primeiro lugar, há pessoas que se salvam sem saber nada sobre a Oração de Jesus. O bom da "Sarça Ardente" foi o fato de os leigos, e especialmente os intelectuais universitários, terem começado a entender que a vida espiritual vai além dos limites da cultura. Mesmo hoje, se você for à Romênia, encontrará uma segunda geração praticando a Oração de Jesus; mas tudo começou sob a influência do Movimento da "Sarça Ardente". Não nego a legitimidade dos leigos que praticam o hesicasmo; no entanto, pessoalmente, estou mais apegado ao modo de pensar dos padres gregos pela necessidade de pelo menos um pouco de iniciação, uma disciplina misteriosa.
Padre, se esta obra se restringe a um grupo seleto, como pode uma nação inteira se tornar espiritual — se apenas alguns eremitas conhecem esta graça especial de Deus? Não é apropriado que o mistério da espiritualidade desça dos mosteiros, das cavernas onde se escondem aqueles que vivem em Cristo, para o meio da sociedade cotidiana? Creio que eles deveriam ser um exemplo vivo; mesmo que nós, leigos, não consigamos atingir seu nível, deveríamos saborear ao menos um pouquinho desta graça especial de Deus. Deus não nos chamou a todos à perfeição, dizendo: Sede perfeitos como é perfeito o vosso Pai que está nos céus (Mt 5,48)?
Sabe o que os monges queriam dizer quando pediram mais supervisão na prática do hesicasmo? Eles não disseram que não deveríamos recitar a Oração de Jesus; Todos os livros de orações impressos na Romênia têm na primeira página: "Senhor Jesus Cristo, Filho de Deus, tem piedade de mim, pecador." E há uma nota dizendo que esta oração pode substituir qualquer outra. Então os monges a recomendaram e a Igreja a recomendou. O que os monges não podiam aceitar era muita intelectualização; toda uma teologia foi criada em torno desta Oração — muita discussão em vez de simplesmente praticá-la. Eles eram a favor da simplicidade; oração é vida, não teoria.
É verdade que é uma tentação teologizar demais os Sacramentos. Quase todos aqueles que vivem a Oração dizem que não se pode adquirir o espírito de oração se não se esvaziar a mente de conceitos, de ideias, de pensamentos.
E isso exige um esforço extraordinário.
É verdade que não se pode alcançar essa simplicidade de que se fala sem a ajuda do Espírito Santo. Mas a mente não se deixa convencer a recitar incessantemente esta Oração. A mente tende a procurar como um espião e deve ser controlada. Sem oração, a mente vai longe demais e não se consegue controlá-la. Além disso, a Oração do Coração é uma obra do Espírito Santo realizada no intelecto; é como uma santificação do intelecto.
Acho que a "Sarça Ardente" se aprofundou demais na teoria, mas não havia outro caminho para eles, porque eram intelectuais. Queriam compreender Deus antes de amá-Lo, antes de Lhe pedir algo em oração. Os monges do mosteiro não são intelectuais. Mesmo que alguns o sejam, deixaram suas mentes à porta do mosteiro; eles compreendem Deus porque O amam e, por sua vez, sua compreensão é ampliada por esse amor. Os intelectuais da "Sarça Ardente" começaram a desenvolver toda uma teologia em torno da Oração do Coração, que sem dúvida tem seu próprio lugar; caso contrário, a Filocalia não teria sido escrita, nem quaisquer escritos dos Santos Padres teriam sido deixados para nós nesta geração. Mas os monges do mosteiro são pessoas práticas; eles condensaram toda a teologia na prática da oração.
Padre, vejo aqui que estamos falando de duas maneiras de alcançar o conhecimento de Deus.
E acho que devemos aceitar ambas.
Cada um leva a um resultado diferente. Não se pode arrancar de um intelectual a inclinação para pensar; não se pode mudar a estrutura de sua mente.
Quando São Nicéforo, o Asceta, diz: "Antes de tudo, irmãos, voltemo-nos para nós mesmos" - para o monge simples isso é algo prático, mas para um intelectual é algo complicado, porque ele é complicado.
Para um intelectual, isso significa abnegação — abandonar tudo o que fez e pensou até então e desnudar-se; só então poderá iniciar sua jornada em direção a Deus.
É por isso que os intelectuais, os professores universitários que vieram à "Sarça Ardente", romperam totalmente com a idolatria de suas criações pessoais. Eles tiveram que reconsiderar a cultura humana de uma perspectiva espiritual...
O Padre [Dimitru] Staniloae confessou que seu tempo na prisão foi a primeira vez que pôde orar sem cessar, com a mente no coração.
Não posso dizer que experimentei a oração como o Padre Staniloae, mas o que sei é que jamais alcançaremos o mesmo nível espiritual de vida que na prisão comunista. Não havia lápis, nem papel, nem TV, nada; especialmente no confinamento solitário, não se podia nem olhar pela janela. Não havia horizonte exterior, nada além das quatro paredes da cela. Era preciso ir a algum lugar; era preciso encontrar uma perspectiva interior, porque, do contrário, enlouqueceria de verdade. Tenho vergonha de dizer que fui forçado a me encontrar na prisão. Eu tinha algumas ideias sobre oração porque vinha do Movimento "Sarça Ardente", mas era principalmente teoria sobre o que é a oração; mas foi ali, naqueles momentos difíceis, que confesso que comecei a recitar a Oração de Jesus e a pratiquei intensamente. Só então pude descobrir quão bela é a vida interior do homem. Gostei muito. Alguns meses antes de descobrir isso, pensei que enlouqueceria, porque a solidão era uma ruptura total com o mundo com o qual eu estava tão envolvido. E sabes que nossa cultura é orientada para fora de nós mesmos; é um conhecimento cosmológico voltado para a existência fora de nós. Agora eu precisava de um método para me encontrar, para me libertar da escravidão dos livros, porque não havia livros lá. Não é exagero dizer que, em liberdade, nos tornamos escravos dos livros; não temos tempo nem para saber quem somos, porque somos feitos de citações...
Como era sua vida espiritual lá?
Eu disse que não cheguei ao nível de São Paulo, para dizer que Jesus é a minha personalidade, Ele está no centro do meu coração, Ele é o selo da minha personalidade autêntica — eu não poderia dizer isso. No entanto, cheguei ao nível de sentir a presença de Deus de forma vívida; isto é, desde então, nunca vi ou imaginei Deus em minhas orações fora de mim, e espero nunca vê-lo em uma "visão" fora de mim enquanto estiver neste mundo. Espero permanecer com a verdadeira compreensão de Deus, não com ilusões. Mas tenho o sentimento da Sua presença. Quando Deus fala com você, Ele não usa palavras materiais, mas lhe traz alegria. Experimentei tantas alegrias na prisão, não conseguia me desligar delas. Nunca me interessei quando me traziam comida ou água...
De qualquer forma, o fato de esses homens [do movimento da Sarça Ardente] terem se esforçado para encontrar a fórmula romena do hesicasmo é importante para nós. Eles estudaram intensamente os manuscritos paisianos de Neamt, o testamento do Ancião Georgie de Cernica e os capítulos da Filocaia, escritos pelo Ancião Vasile de Poiana Marului. Eles enfatizaram em seus estudos o caráter integral e harmonioso do hesicasmo romeno. Na tradição do ascetismo dos Cárpatos, não há lugar para automortificação, cintos com pregos, autoflagelação, nem mesmo a obrigação do celibato. Há muitas pessoas casadas na Romênia praticando a Oração do Coração. O exercício é puramente espiritual.
Hoje, quando nosso país quer seguir o caminho da reforma democrática, e se deixarmos de lado todos os argumentos, todas as acusações, todo desejo de vingança e todos os discursos demagógicos que, na verdade, nada mais são do que nossas próprias fraquezas e incapacidade de penetrar no templo interior do Espírito Santo que está em nós? Só podemos derrotar Satanás com Deus, que está dentro de nós. Sigamos o caminho dos grandes ascetas do nosso povo nestes momentos de crise, pois somente disso virá a nossa salvação.
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