A SAGRADA INATIVIDADE

TKACHEV Andrey, Arcipreste
tradução de monja Rebeca (Pereira)


Joaquim e Ana permaneceram estéreis por muito tempo. Assim diz a Tradição. O significado desta esterilidade nos é difícil entender. Mas precisamos tentar. A esterilidade do útero é uma espécie de Sabá prolongado. Afinal, o Sabá não se referia apenas ao trabalho de parto imediato, mas também às relações com os escravos, a terra e os animais de tração. A terra em pousio (ndT: terra cultivável que é deixada sem cultivo por um período determinado para permitir o descanso e a recuperação do solo, melhorando sua fertilidade e bioestrutura) servia como um Sabá para Deus. E o boi, tendo descansado um pouco das suas dores, guarda o sábado. O ventre de Ana também guarda o sábado e não concebe por longo tempo.

Agora, passemos destas palavras para outras. Quando o Senhor Jesus é morto na Cruz (causa de vergonha), sábado se aproximava. Os guardas removem às pressas o corpo de Jesus do instrumento de execução e o depositam num túmulo novo, "para que o corpo não permanecesse na cruz no dia de sábado — pois aquele sábado era um grande dia". As Miróforas, portanto, sob o jugo da Lei, tinham que suportar um ritual dia e noite inteiros antes de irem ao túmulo do Senhor carregando a mirra, ao amanhecer do primeiro dia. Este descanso sabático para as mulheres portadoras de mirra foi talvez o descanso sabático mais difícil da história de Israel. Uma coisa é descansar. Mas é outra coisa quando você está pronto para correr, arrancar os cabelos, chorar e ir a algum lugar — sabe-se lá para onde — mas precisa ficar sentado o dia inteiro, de acordo com o mandamento. Ah! Aqueles foram dias maravilhosos de inação muito difícil. A inação em geral é algo muito difícil.

Talvez você pense que a maioria das pessoas está cansada da correria e sonha com a paz? De jeito nenhum. Elas não conseguem viver de outra forma que não seja na correria. Coloque-as em silêncio e elas começarão a bater a cabeça na parede, implorando para serem liberadas para a televisão em volume máximo, os comerciais piscantes, os boatos e as fofocas. "Como pode ser sem mim? Como posso deixar de saber, ouvir e ver?" Veja, todos estão correndo, e eu ainda estou guardando o sábado. Isso é uma tortura. O sábado é uma tortura para uma pessoa vaidosa.

Mas e se o útero estiver guardando o sábado? E se quisermos ter filhos, mas o útero não puder sustentar a semente? O homem moderno é impaciente. Ele usa recursos da tecnologia médica para servir ao seu egoísmo. Se não tivermos filhos, nós os teremos. Vamos nos inseminar com a semente de outra pessoa. Vamos contratar uma barriga de aluguel. Vamos fazer o que pudermos, mas não vamos ficar de braços cruzados. Certo? Mas Joaquim e Ana guardaram o sábado. Seus ventres eram estéreis, e os justos idosos não faziam nada além de orar. Precisamos sentir essa diferença entre essa visão de mundo e a nossa. Precisamos senti-la.

Finalmente, a paciência é recompensada. Ouso entrar sorrateiramente no quarto dos pais da Mãe de Deus por um breve momento para dizer: houve um milagre! A luxúria da velhice se foi, mas o desejo de ter um filho permaneceu. E nos corpos velhos, secos e cansados, surgiu uma atração conjugal mútua, eis uma intimidade sagrada entre os justos idosos, uma proximidade que se revelou, com o tempo, como um peso no coração. O sábado terminou. A paciente expectativa de misericórdia e a sagrada inação acabaram. Chegou a hora do domingo, ou seja, o primeiro dia da semana, que em breve receberá esse nome. Assim, a ociosidade sagrada é coroada. Há a ociosidade pecaminosa, nascida da preguiça e do desânimo. E há a ociosidade sagrada, nascida do pensamento de que nem tudo no mundo depende de mim. Tudo já foi feito. Preciso descansar e não me deixar abater pelo que está além do meu controle. Essa inação é uma expressão de fé e coragem diante d´Aquele que conserta todas as coisas.

Então, é hora de aprendermos a arte sagrada da inação. Algumas pessoas precisam aprender a importância de trabalhar até a exaustão, porque são preguiçosas. Mas muitos precisam ser incutidos com a ideia de espera silenciosa, a ideia de inação silenciosa enquanto esperam por respostas de Deus, a quem vocês levaram seus pedidos.

Que possamos aprender, com o tempo, tanto a atividade benéfica quanto a retirada benéfica da atividade. Que nenhuma delas nos escape. Pois a secura, o vazio, a longa espera pela graça e a sensação de futilidade também são benéficos ao homem. Elas o fortalecem. Permitem que ele sinta a grandeza da dádiva divina que se segue. E o que seria da chegada à Terra Prometida sem os fantasmas perenes do deserto pairando atrás dele?

Joaquim e Ana foram estéreis por muito tempo. Joaquim e Ana finalmente deram à luz um filho. Joaquim e Ana passaram os dias de sábado estéreis. Joaquim e Ana experimentaram uma espécie de ressurreição, dando à luz a Mãe de Jesus.

Que a fecundidade espiritual chegue a todos nós após muitos anos de genuína esterilidade. Que assim seja — quando Deus quiser, quando estivermos prontos.










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