A SABEDORIA E O PODER DE DEUS: HOMILIA PARA A FESTA DA EXALTAÇÃO DA SANTA CRUZ
LEMASTERS Philip, sacerdote
tradução de monja Rebeca (Pereira)
Não importa o que seja, todos confiam em algo ou em alguém. Apostamos nossa saúde, felicidade e até mesmo nossas vidas em todos os tipos de pessoas todos os dias, desde nossos familiares e amigos até pessoas que não conhecemos, como pilotos de avião e os operários que fabricam nossos carros. Se nos recusássemos a confiar nosso bem-estar a alguém, simplesmente não poderíamos viver em sociedade.
No cerne da nossa fé como cristãos ortodoxos está nossa profunda confiança em uma Pessoa, nosso Senhor, Deus e Salvador Jesus Cristo. Por Sua Cruz, nosso Salvador venceu o pecado e a morte e tornou possível que todos nós nos tornássemos participantes da vida eterna.
Crer no poder da Sua Cruz não é simplesmente afirmar que Cristo morreu nela ou ser capaz de descrever em palavras por que ela é importante para a nossa fé. Não, crer e confiar na Cruz de Cristo é apostar nossas vidas em Sua oferta sacrificial. É pensar, agir e falar de coração de maneiras que manifestem o caminho de santa e amorosa obediência do nosso Senhor. É para que a Cruz se torne a verdade profunda de nossas vidas. E assim como ninguém forçou ou exigiu que o Salvador aceitasse a Cruz, ninguém nos obriga a tomar nossas cruzes ou a seguir Seu caminho de amor altruísta.
Seja na Palestina do primeiro século ou na América do século XXI, o caminho da Cruz não é popular nem fácil; naturalmente, não atrai ninguém. Nunca devemos esquecer que os romanos pregavam pessoas em cruzes para que morressem de forma dolorosa e lenta. Eles as humilhavam e torturavam publicamente como um lembrete para todos os outros do que fariam com seus inimigos. Quem se sentiria atraído por isso?
São Paulo reconheceu a ofensa da cruz ao chamá-la de pedra de tropeço para os judeus e loucura para os gentios. Em outras palavras, os judeus esperavam um líder político e militar convencional para conquistar seus inimigos terrenos, não alguém que morresse uma morte vergonhosa nas mãos dos romanos. Para os gentios, a crucificação era a maneira mais vergonhosa de morrer; consequentemente, não fazia sentido adorar alguém que morresse daquela forma. Mas São Paulo experimentou pessoalmente a nova vida que o Salvador crucificado e ressuscitado trouxe ao mundo. Ele conhecia em sua alma o poder e a sabedoria de Deus que parecem loucura e fraqueza para aqueles que vivem e morrem pelos falsos deuses deste mundo. Ele proclamou Alguém tão forte e justo que venceu o pior que líderes políticos e religiosos corruptos poderiam fazer a Ele. São Paulo confiou neste Senhor e literalmente apostou sua vida n´Ele, morrendo como mártir.
Talvez tenhamos ouvido a história da crucificação de Cristo tantas vezes que perdemos o senso de choque e horror diante da tortura pública e da execução do Filho de Deus Encarnado. Esta não foi apenas a morte de um ser humano inocente, mas o massacre do Deus-Homem. Aquele que criou o universo por meio da palavra tornou-Se o Cordeiro Pascal que tira os pecados do mundo por meio de Seu sacrifício. Aquele que é "Santo, Santo, Santo" aceitou a pior miséria e punição que a humanidade caída poderia conceber para nos salvar.
Aqueles que adoram os falsos deuses do poder, da riqueza e do prazer continuam a vê-Lo e à Sua Cruz como tolos e fracos. Mas aqueles que, como São Paulo, experimentaram em suas almas a sabedoria e o poder de Deus sabem mais. Este não é o tipo de conhecimento que confirma que "dois mais dois são quatro", mas o tipo de conhecimento que advém somente da confiança, do amor e do encontro pessoal. O verdadeiro conhecimento espiritual se enraíza na alma e é fruto da experiência, não de pensamentos abstratos. Mesmo aqueles que afirmam que poder, riqueza e prazer são as verdades supremas da vida o fazem não porque sejam particularmente inteligentes, mas porque amam o poder, a riqueza e o prazer. Eles entregaram suas vidas a eles e é assim que veem o mundo. Da mesma forma, não há caminho para o conhecimento do poder da Cruz sem tomarmos nossas cruzes, sem servir a Cristo por meio de vidas de obediência e amor sacrificial. Devemos nos confiar a Ele se quisermos conhecê-Lo e ao poder de Sua Cruz.
Confiar no Senhor dessa maneira não é simplesmente ter pensamentos e sentimentos religiosos. Pense no que realmente significa confiar em outro ser humano que é muito próximo de você. Não se trata apenas de palavras, pensamentos ou mesmo ações ocasionais, mas de um relacionamento contínuo que nos transforma, exige algo de nós diariamente e abre nossos olhos para novas dimensões de quem essa pessoa é e de quem podemos nos tornar. Se realmente amamos alguém, nos sacrificamos por essa pessoa de maneiras significativas e contínuas. Portanto, se você se pergunta por que a Igreja nos chama a orar, jejuar, perdoar, arrepender-nos, dar aos necessitados e levar uma vida pura e justa, aqui está uma parte importante da resposta. É por meio dessas práticas, feitas com fé e humildade, que fortalecemos nosso relacionamento com Jesus Cristo. Conhecemos e experimentamos o Senhor ao nos confiarmos a Ele por meio de passos práticos que damos todos os dias para servi-Lo e ao nosso próximo, em quem Ele está presente.
Em Sua crucificação, Jesus Cristo deixou claro que não é alheio nem mesmo aos nossos mais horríveis sofrimentos, dores e medos. Nossa salvação não se manifestou em um mundo imaginário de pessoas perfeitas e sem problemas, mas na mesma realidade fragmentada que vivenciamos todos os dias. Nesta Festa da Exaltação da Santa Cruz, lembremo-nos de que Aquele que é digno de nossa confiança é Aquele que suportou todas as consequências do pecado e da morte para nos conduzir à Sua santidade e à vida eterna. Ele o fez puramente por amor, mesmo por aqueles que O mataram. A Cruz de Cristo manifesta o amor de Deus que venceu até o túmulo e o Hades. Portanto, confiemos a Ele nossas vidas e tomemos nossas cruzes diariamente para que cresçamos em nosso conhecimento do Cristo crucificado. Pois, como disse São Paulo, "a palavra da Cruz é loucura para os que perecem, mas para nós, que somos salvos, é poder de Deus".
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