Criando-os corretamente - Conselhos sobre a formação de crianças (parte 5)

SÃO TEÓFANO, O RECLUSO

Se a ordem de ação prescrita para o corpo e para as capacidades inferiores é estritamente mantida, disso a alma receberá uma esplêndida preparação para uma atitude verdadeiramente boa. No entanto, isso é só uma preparação. A atitude mesmo deve ser formada por uma ação positiva em todos os seguintes poderes: mente, vontade e coração.

Nas crianças, o poder de pensar manifesta-se rapidamente. Chega ao mesmo tempo que o falar e cresce acompanhando o desenvolvimento deste. Por isso, a formação da mente deve ser iniciada concomitantemente com as primeiras palavras. A coisa mais importante a ter-se em mente é que devem existir conceitos e julgamentos justos, de acordo com os princípios Cristãos, acerca de tudo que a criança encontre ou que chegue à atenção dela: o que é certo e o que é errado; o que é bom e o que é mau. É muito simples fazer-se isso por meio de conversações comuns e questões ordinárias. Os pais devem conversar entre si, freqüentemente. As crianças ouvem tudo e, quase sempre, assimilam não só as idéias, como também a entonação de voz e gestos.

Os pais, quando falarem, devem chamar as coisas pelos seus nomes próprios. Por exemplo: Qual é o significado da vida presente? Como ela termina? De onde vêm todas as coisas? O que são os prazeres? Que valor tem certos costumes?

Que os pais falem com suas crianças e expliquem diretamente a elas, ou, de preferência, contando histórias. É bom, por exemplo, vestir-se bem? É agradável quando se recebe louvor? Ou que eles perguntem às crianças, o que elas acham de uma coisa ou de outra, corrigindo então seus erros. Em pouco tempo, por esses meios simples, pode-se comunicar princípios corretos para o julgamento das coisas, e esses princípios não serão apagados por um longo tempo, e podem mesmo a vir a permanecer por toda a vida.

Dessa maneira, o pensamento mundano e iníquo e a curiosidade insaciável são suprimidos em sua própria raiz. A verdade liga a mente àquilo que a satisfaz, mas o pensamento mundano não satisfaz e, por isso, acende a curiosidade. Faz-se um grande favor à criança, preservando-a desse pensamento mundano. Isso está antes delas começarem a ler livros.

Mais adiante, não se deve, seja por que razão for, dar às crianças livros com conceitos corruptos. Suas mentes serão então preservadas inteiras, em saúde santa e divina. É inútil não tentar exercitar a criança dessa maneira, na suposição de que ela ainda é pequena. A verdade é acessível a qualquer um. Que uma pequena criança Cristã é mais sábia que os filósofos, a experiência já demonstrou. Essa experiência é repetida, algumas vezes hoje em dia, mas nos primeiros tempos (no Cristianismo) mostrava-se por toda parte.

Por exemplo, durante o período do martírio, crianças pequenas discursavam sobre Cristo, o Salvador, sobre a loucura da adoração de ídolos, sobre a vida futura e sobre diversos assuntos correlatos a esses. Isso acontecia porque suas mães e pais haviam explicado a elas essas coisas, em conversas simples. Essas verdades tornaram-se então próximas ao coração, que começou a entesourá-las, o que é o meio de tornar alguém pronto a morrer por elas.

Uma criança tem muitos desejos. Qualquer coisa capta sua atenção, a atrai, e dá nascimento a desejos. Sendo incapaz de distinguir o bem do mal, ela deseja tudo, e está pronta a fazer de tudo para obter o que deseja. Uma criança largada a si própria torna-se indomável e obstinada. Por essa razão, os pais devem observar, cuidadosamente, o desabrochar dessa atividade da alma.

O meio mais simples de confinar a vontade dentro de limites adequados consiste em dispor a criança a não fazer nada sem permissão. Elas devem ser sequiosas de correr para os pais e perguntar: "Posso fazer isso ou aquilo?" Elas devem ser persuadidas por sua própria experiência e por experiência de outros mostrando-lhes que atender seus desejos próprios sem pedir é perigoso. Devem ser postas em um estado mental no qual cheguem até mesmo a temer seus próprios desejos. Essa disposição é a mais afortunada, e, ao mesmo tempo, a mais fácil de ser implantada na criança. Como elas, em sua maior parte, dirigem suas questões para os adultos, constatando sua própria ignorância e fraqueza, esse estado de coisas só tem que ser elevado e colocado como lei absoluta para elas.

A conseqüência natural de tal atitude será total obediência e submissão em tudo, à vontade dos pais, mesmo quando for contra a vontade própria, a disposição a negar-se em muitas coisas, e o hábito e a habilidade de fazer isso. A coisa mais importante, a convicção baseada na experiência, que não se deve obedecer a si próprio em tudo, é a coisa mais compreensível para as crianças pela sua própria experiência, porque elas desejam muitas coisas, e, freqüentemente, essas coisas são nocivas para seus corpos e almas.

Enquanto se está treinando uma criança a não fazer sua própria vontade, deve-se também treiná-la a fazer o bem. Para isso, os pais devem dar um bom exemplo de vida para o bem e habituar suas crianças com pessoas cujas preocupações não sejam prazeres e julga mentos, mas a salvação da alma. As crianças adoram imitar. Quão cedo elas aprendem a copiar a mãe ou pai! Aqui ocorre algo similar ao que ocorre com instrumentos afinados identicamente.

Ao mesmo tempo, deve-se inspirar as crianças às boas obras. Primeiramente, deve-se ordenar-lhes fazerem boas obras. A seguir, conduzi-las a fazerem boas obras por si próprias. As boas obras, mais comuns nesse contexto, são: esmola, compaixão, misericórdia, condescendência com os outros e paciência. Não é difícil treiná-las a fazer essas coisas. Oportunidades para tal ocorrem a cada minuto. Tem-se só que usá-las.

Se a mente, a vontade e os poderes inferiores estiverem agindo do modo descrito, é completamente esperado e natural que o coração esteja disposto a ter sentimentos justos e verdadeiros e que adquira o hábito de gostar daquilo que é verdadeiramente para ser gostado e que não tenha simpatia por qualquer coisa que, a título de prazer, injeta veneno na alma e no corpo. O coração é a capacidade de testar e sentir satisfação.

Quando o homem estava em união com Deus, encontrava delícias nas coisas divinas e sagradas pela Sua graça. Depois de sua queda, deturpou seu gosto e tornou-se sedento do que é sensual. A graça do batismo removeu esse gosto deturpado, mas a sensualidade está de novo pronta a encher o coração. Não se deve permitir isso; deve-se guardar o coração.

O meio mais efetivo para a educação do verdadeiro gosto no coração é uma vida centrada na Igreja, na qual todas as crianças, em seu crescimento, devem ser mantidas infalivelmente. Simpatia pelo que é sagrado, prazer em permanecer nesse meio sagrado por causa de sua quietude e calor, separação do que é brilhante e atrativo na vaidade mundana, tudo isso não pode ser melhor implantado no coração do que por uma vida centrada em Igreja. O prédio da Igreja, seus cânticos, seus ícones são os primeiros objetos de arte excelentes em conteúdo e poder.

Deve-se lembrar que é de acordo com o gosto do coração que a futura mansão eterna será dada, e que o gosto no coração será aquele formado aqui na terra. É evidente, assim, que teatros, shows e coisas similares não são adequados para Cristãos.

Uma alma que tenha sido acalmada e ordenada dessa maneira, não atrapalhará, de acordo com sua desordem natural, o desenvolvimento do espírito. O espírito se desenvolve mais facilmente do que a alma, revelando seus poderes e atividade mais cedo do que a alma.

Ao espírito pertence: 1) o temor de Deus (correspondendo à mente), 2) a consciência (correspondendo à vontade); e 3) oração (correspondendo aos sentidos). O temor de Deus faz nascer a oração e torna a consciência clara.

Não há necessidade de dirigir tudo isso ao outro mundo, o invisível. As crianças já têm uma predisposição para isso, e assimilam esses sentimentos. Especialmente a oração é introduzida com muita facilidade e age não pela língua, mas pelo coração. É por isso que as crianças, desejosamente, e sem fadiga, participam das orações em casa e nos ofícios da Igreja e ficam felizes em fazê-lo. Sendo assim, não deveriam ser privadas desta parte de sua educação, mas, pouco a pouco, deveriam ser conduzidas ao santuário de nossos sentimentos. Quanto mais cedo for introduzido o temor de Deus e nascer a oração, mais sólida a devoção pelo resto da vida.

Em algumas crianças, esse espírito manifesta-se, espontaneamente, mesmo entre obstáculos evidentes para o seu surgimento. Isso é muito natural. O espírito de graça recebido no batismo, se não foi enfraquecido por um desenvolvimento impróprio do corpo e da alma, só pode dar vida ao nosso espírito, e o que pode impedi-lo de manifestar-se em seu poder?

A consciência,entretanto, exige um controle estrito. Conceitos justos, paralelos ao bom exemplo dos pais e outros meios de ensinar o bem, e a oração iluminam a consciência e nela imprimem fundações suficientes para a boa atividade subseqüente. No entanto, o mais importante é que deve-se formar na criança uma atitude de integridade e consciência. Consciência é algo extraordinariamente importante na vida, mas tão fácil quanto formá-la é sufocá-la na criança.

A vontade dos pais é, para a criança pequena, a lei da consciência e de Deus. Que os pais de acordo com seu melhor entendimento, dêem seus comandos, de maneira tal, que as crianças não sejam forçadas a transgredi-los. Se elas o transgridem, devem ser dispostas tanto quanto possível ao arrependimento.

O que a geada é para as flores, é a transgressão da vontade dos pais para uma criança. Ela não consegue olhar os pais nos olhos. Não deseja receber amabilidade. Quer correr e estar sozinha. Ao mesmo tempo, sua alma se torna rude e começa a crescer agressiva. É uma boa atitude dispô-la algum tempo ao arrependimento, de maneira que, sem medo, com confiança e lágrimas, possa a vir a dizer: "Eu fiz algo de errado."

Não é necessário ressaltar que tudo isso diz respeito só às coisas comuns; mas o que é bom é que assim é formada uma fundação para um caráter futuro constante e verdadeiramente religioso, que se levanta imediatamente após uma queda, e é formada a capacidade de um rápido arrependimento e de limpar-se ou renovar-se com lágrimas.

Demos aqui a ordem de uma vida de criança. Que a criança cresça nela, e o espírito de devoção, nela se desenvolverá mais ainda. Os pais devem seguir todos os movimentos dos poderes nascentes da criança, e dirigir tudo para um único fim.

Essa é a regra: Inicie com a primeira respiração da criança. Comece tudo ao mesmo tempo. Não só uma coisa. Faça tudo isso incessantemente e regularmente, por degraus, sem saltos, com paciência e expectativa, observando uma sábia gradualidade, tomando nota dos resultados e fazendo uso deles, não considerando coisa alguma desimportante em assunto tão importante. Não esmiuçaremos detalhes aqui, pois temos a idéia de indicar somente a direção mais importante para um salutar crescimento.

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