A TRADIÇÃO DA ICONOGRAFIA

 WARE Timothy (Kallistos)
tradução de monja Rebeca (Pereira)
 


A Tradição da Igreja é expressa não através de palavras, nem ações e gestos vivenciados na veneração, mas também através da arte, da grafia e a cor dos Santos Ícones. Um ícone não é simplesmente uma figura religiosa a despertar as emoções adequadas no espectador, antes um dos modos pelos quais Deus Se revela a nós. Através de ícones, o cristão ortodoxo, recebe uma visão do mundo espiritual. Pelo fato do ícone fazer parte da Tradição, os pintores de ícone (iconógrafos) não são livres para adaptar seus próprios sentimentos estéticos, mas a mente da Igreja. A inspiração artística não está excluída, antes exercida dentro de regras (cânones) prescritas. É importante que iconógrafos sejam bons artistas, no entanto, mais importante ainda é que sejam cristãos sinceros, vivendo no espírito da Tradição, preparando-se pela Confissão e a Santa Comunhão.
 
 
O Objetivo desta Arte Sacra
"Assim, dizemos que um navio, animal ou planta é boa, não por sua formação ou por sua cor, mas a partir do serviço que presta" (São João Crisóstomo). O mesmo acontece com esta arte sacra; sua natrueza é boa, não por conta de ser a "arte da Igreja", mas pelo serviço que presta à Igreja. Como tal, está entrelaçada com a vida, a evolução e toda a Tradição da Igreja.
 
Constantino Kalokyris, em sua obra intitulada Iconografia Ortodoxa, sugere que o caráter e o significado fundamental da Iconografia Ortodoxa é:
 
1. A Arte de Serviço Espiritual
O conteúdo da Iconografia Ortodoxa foi diretamente determinado pelas necessidades e o profundo propósito espiritual da Igreja. Ela serve para inspirar, ensinar, guiar e encorajar os fiéis em sua busca de perfeição espiritual. Iconografia expressa santidade e os significados mais sublimes da Ortodoxia em seu conteúdo sagrado: o Salvador, a Mãe de Deus, os Apóstolos, os Poderes Angélicos, e os Mártires da .
 
2. A Arte Litúrgica
O Mistério da Sagrada Eucaristia é o centro e a essência da Liturgia (obra do povo). Desde sua criação, a Iconografia estava preocupada principalmente com este propósito essencial da Igreja. Como tal, tem tentado contribuir com seus próprios meios para a compreensão  pela parte dos fiéis do grande Mistério da Sagrada Eucaristia e de todo o drama litúrgico. Ilustrado nos mais antigos símbolos sagrados: o peixe, o pão, o cordeiro sacrificial, o sacrifício de Abraão, etc. A Iconografia envolve os temas litúrgicos da Comunhão dos Apóstolos, a liturgia dos Anjos, o auto-sacrifício, os hierarcas co-celebrante... Ela simplesmente tenta tornar o conteúdo compreensível sublime da Divina Liturgia e em especial o ato litúrgico da Sagrada Eucaristia.
 
3. Arte de Teologia elevada
Esta arte não é apenas religiosa, como no Ocidente, mas também teológica. Seus temas não estão apenas relacionados com a história religiosa, mas são organizados de acordo com a elevada teologia da Igreja Ortodoxa. Como tal, as Igrejas Ortodoxas são repletas de imagens não apenas da paixão, mas com a arte que retrata a vida de nosso Senhor (as Doze Grandes Festas da Igreja), a Mãe de Deus, os Santos, os Evangelistas e os Poderes Angélicos, sob as bênçãos do Senhor. Além de estarem "representados" de maneira a sugerir sua verdadeira natureza: em comunhão com os Santos, terrenos, ou privados do Espírito da Graça.
 
4. Uma Arte de profundidade
Iconografia Ortodoxa é uma forma de arte expressionista que procura transmitir a mais profunda experiência de vida que a alma possui. Arte bizantina, portanto, usa recursos de animação intensa (isto é, olhos grandes, boca pequena, orelhas grandes), cores brilhantes, e as posturas (postura frontal ou seja, dos Santos que estão em comunhão direta com Deus) para sugerir o verdadeiro "espírito” do Santo retratado. Diferenças entre a arte sacra do Ocidente e do Oriente são ilustrados em ambos os ícones da Crucificação e Ressurreição.
 
5. Relação com modelos Ideais e Naturais
Tudo na Igreja deve aludir ao mundo celeste, espiritual e transcendental. Portanto, a Iconografia Ortodoxa evita a representação das formas sagradas de acordo com a realidade natural e procura, através de uma abstração verdadeiramente maravilhosa, para expressar a realidade espiritual que constitui a verdade maior.
 
Questão e Forma (Conteúdo e Estilo) da Iconografia Ortodoxa
O pressuposto básico da Iconografia Ortodoxa desenvolvido pela Sagrada Escritura, pelos Concílios Ecumênicos, e pelos Padres da Igreja é a de um "novo" homem e de um "novo" mundo, em Cristo. Esta arte subordinada à Igreja foi obrigada a formular tal idéia em sua expressão.
 
Os Fundamentos da Iconografia:
• A pessoa de Cristo não é retratada exclusivamente com características humanas tal como no Ocidente. Ele não é apenas humano, mas ao mesmo tempo Deus e homem.
Deus-Pai não pode ser retratado.
A Mãe de Deus não é representada simplesmente como uma virgem antes do Espírito do Senhor vir pairar sobre Ela. Antes indica o dogma da Encarnação, trazendo em Si Aquele Que não pode ser contido.
Os Santos são "representados" como cidadãos dos Céus sugerindo a realidade abençoada para além deste mundo.
 
As particularidades da Iconografia
A coloração no rosto e os detalhes do corpo nu, a transição entre a pessoa das trevas à luz de Cristo.
• Ós órgãos sensoriais não são apresentados de acordo com a natureza, com a realidade anatômica que conhecemos pois que cada um deles tendo percebido e recebido a revelação divina, torna-se, desde então, um instrumento do Espírito.
A boca é de  forma pequena. Ela indicar que a pessoa sagrada obedece ao Mandamento sagrado de Deus (não andeis ansiosos pela vida preocupados com o que comereis), buscando primeiro o alimento da vida, (o Reino dos Céus e Sua justiça).
A coroa de luz na Iconografia Ortodoxa – auréola – significa a glória que irradia da pessoa representada. Ela envolve a cabeça por ser ela é o centro do espírito, pensamento e compreensão.
Os pés e as mãos são igualmente "distorcidos". As mãos são geralmente proporcionais à cabeça (pelo menos a mão da benção) com dedos longos, significando uma intensidade espiritual, enquanto os pés são grandes e pouco fundamentados.
O corpo nu é subjugado e neutralizado pelo espírito.
• O projeto de vestuário ou a expressão do corpo espiritual dos Santos cobertos por eles. Em virtude de suas dobras simples e suas sobreposições mais amplas, eles não parecem naturais, cubrindo simplesmente o corpo humano.
• O principal interesse na Iconografia é limitado às pessoas sagradas, enquanto o segundo plano é subordinado a eles. Portanto, o segundo plano não aparece independente das pessoas, mas dependente delas.
 
O Ícone mais perfeito
A pessoa de Cristo.
 
O Ícone Verbal de Cristo
O livro das Sagradas Escrituras.
 
Um Ícone de Deus na Criação
Criados à Sua semelhança, os seres humanos são ícones de Deus através da virtude, ou seja, não fisicamente, mas através de nossa liberdade, nossa razão, nosso senso de responsabilidade moral, enfim, tudo que nos distingue da criação animal.
 
A Controvérsia iconoclasta
Iconoclastas quebradores de Ícones, duvidosos de que qualquer arte religiosa pudesse representar seres humanos ou Deus.
Iconódulos veneradores de ícones e defensores vigorosos do uso de ícones na Igreja.
 
A controvérsia Iconoclasta que durou cerca de 120 anos, se divide em duas fases. Primeiramnte, em 726, quando Leão III inicia seu ataque aos ícones, concluíndo-se em 780 com a suspensão das perseguições por parte da Imperatriz Irene. A posição dos iconódulos foi confirmada pelo Sétimo e último Concílio Ecumênico (787), que se reuniu, tal como o Primeiro, em Nicéia. Este Concílio proclama que os ícones devem ser mantidos nas igrejas e honrados com a uma veneração correspondente à "preciosa e vivificante Cruz" e o Evangeliário. Um novo ataque aos ícones, iniciada por Leão V, o Armênio, em 815 continua até 843, altura em que os ícones são novamente reintegrados, por outra Imperatriz, Teodora. A vitória final das Imagens Sagradas em 843 é conhecido como o "Triunfo da Ortodoxia", comemorado num ofício especial no "Domingo da Ortodoxia" –  Primeiro Domingo da Grande Quaresma.
 
A Veneração dos Ícones
Os ícones são símbolos. A reverência e veneração dirigida aos ícones não é direcionada à madeira, à pedra, ou à pintura, mas antes às pessoas ai representadas.
 
 

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