Por que ser cristão?
O entrevistador é Mark
Makarov, evangelista americano, animador de uma emissão de rádio com a
participação telefônica ao vivo.
MAKAROV: Padre
Alexandre, gostaria muito de lhe fazer uma pergunta que me foi colocada por
vezes. É necessário ser cristão e, se a resposta for afirmativa, por quê?
MIEN: Só existe uma
resposta a esta pergunta, penso eu, e ela consiste no fato de o mundo ter sempre
buscado a Deus; é a condição humana normal de se engajar de uma forma ou de
outra com aquilo que lhe é mais elevado, com um ideal – mesmo até quando o
espírito do homem deforma ou minimiza o ideal ou o transforma em uma busca
puramente civil. Tomemos a época do Stalinismo, do Maoismo ou de todo outro
movimento em ‘ismo’ e veremos que quando privamos, pela força, o povo de sua
busca de Deus, o povo reconecta sempre uma pseudo-divindade. A idolatria
substitui a fé mas a aspiração instintiva a Deus permanece. No entanto, vejamos
porque devemos ser particularmente cristãos.
MAKAROV: Talvez por
causa da Bíblia?
MIEN: Todas as
religiões têm seus livros sagrados, alguns são plenos de sabedoria, de poesia,
se profundidade espiritual. Muitos livros sagrados do Oriente, por exemplo
naqueles da Índia, o Mahabharata, a parte que chamamos de Bhagavad Gîtâ, sem
esquecer os Sutras budistas, contêm um tesouro e conhecimento e são escritos
magníficos. Então o que pode ter de outro?
MAKAROV: A arte cristã?
MIEN: Hoje na Rússia,
as pessoas se tornaram entusiastas por nossa arte medieval. Eu mesmo a admiro
muito, mas para mim se trata de um aspecto de nossa cultura espiritual. Se
olharmos objetivamente, sem subjetividade, que não seja minha fonte pessoal,
então a arte da Grécia antiga também é religiosa, a arte indiana é espiritual,
(...) e as religiões são repletas de belíssimos edifícios antigos (e modernos)
e assim o Cristianismo não pode se ostentar de um privilégio neste domínio.
Logo, devemos nos perguntar, mais uma vez, por que o Cristianismo?
MAKAROV: A moral cristã?
MIEN: Sim, de acordo.
Estou muito satisfeito pelo fato de em nossos dias os valores morais do
Cristianismo sejam reconhecidos em nossa sociedade. Mas, devemos admitir que é
tudo simplesmente falso e não passa de propaganda para sugerir que não existem
valores morais fora do Cristianismo (...) não é o momento de enumerar os
princípios morais de todas as sociedades, mas não restam dúvidas que se
encontrará também todas as ideias fundadoras da ética nos escritos dos estóicos
e dos budistas, bem como no Antigo Testamento que, ainda que tendo dado a luz
ao Cristianismo, é em verdade uma religião pré-cristã. (...) Existe uma
severidade no Antigo Testamento que certas pessoas na Rússia estimam ausente no
Novo Testamento. No entanto, esta ideia é aberrante, pois nosso Senhor Jesus
jamais foi sentimental, sendo na maioria das vezes severo em Seus Mandamentos.
Devemos ler os Evangelhos com óculos de rosa para não ouvirmos dizer: “Ai de
vós escribas e fariseus!” ou “Afastai-vos de Mim, malditos, para o fogo
eterno!” (Mt. 23 13, 25, 41). Isto não inspira sentimentalismo.
É claro, a ética cristã tem
seus traços particulares. Mas se alguém do exterior chegasse e fizesse uma
comparação da ética cristã com aquela, digamos, dos estóicos – por exemplo,
Épicuro, Epicteto e outros Sêneco, que viviam na época dos Evangelhos – esta
pessoa encontraria muitas aproximações com os Evangelhos – ainda que os
filósofos gregos jamais os leram.
Então, ainda, por que o
Cristianismo? Devemos admitir no fim das contas a ideia do pluralismo
religioso? A ideia que Deus Se revela podemos conhecer em não importa qual
forma de religião? Neste caso, podemos fazer seu luto da unicidade do
Cristianismo; seu luto da fé cristã.
Mas, retornemos à questão
central: parece-me que nada pode demonstrar o caráter único do Cristianismo com
exceção de Jesus Cristo. Estou convencido de que todos os fundadores de grandes
religiões nos falam em verdade. Lembremos o que disseram.
Buda disse ter atingido um
estado de despojamento completo após longos e difíceis exercícios. Podemos crer
nele? Sim, podemos. Era uma personalidade fora do comum e realizou isto com
certeza.
Os filósofos gregos falam
da dificuldade intelectual de atingir a ideia de Deus e do mundo espiritual.
Isto é verdade. Ou então Maomé. Que dizia que diante de Deus sentia-se como um
nada, que Deus o havia tomado e que diante de Deus ele não passava de um
mosquito. Podemos crer nele? Mas é claro que sim!
Ou então: Somente dentre
estes mestres, aquele que fala em seu próprio nome como Deus Ele-Próprio: “Mas
Eu vou digo” (Mt. 5, 22) ou como está escrito em João: “Eu e o Pai somos Um”
(Jo. 10., 30). Nenhum destes grandes mestres das religiões do mundo jamais
disseram algo parecido. Esta é então a única ocasião na história em que Deus Se
manifesta em toda Sua plenitude por uma pessoa real. É isto que encontramos nos
Evangelhos.
Jesus, o predicador da
moralidade – é um mito histórico. Não O teríamos crucificado somente por isto.
Jesus, o Messias, auto-proclamado? Por que então não crucificamos Bar-Cochba,
que também dizia ser o Messias? E existem muitos falsos Messias! O que tinha em
Jesus que provocava tanto amor e tanta raiva? “Eu sou a porta”, dizia Ele, a
porta à eternidade (cf. Jo. 10, 9). Parece-me que tudo que tem valor no
Cristianismo o tem pelo fato de provir de Jesus Cristo. O que não é de Cristo
poderia muito bem ter vindo do Islão ou do Budismo.
Cada religião é um caminho
a Deus, uma especulação concernindo Deus, uma aproximação humana a Deus. É um
vetor que se dirige ao alto. No entanto, o advento de Cristo é a resposta, um
vetor vindo do alto em nossa direção. Por um lado, um acontecimento situado na
história, por outro, algo que ultrapassa completamente a história. É a razão
pela qual o Cristianismo é único, porque Cristo é único. Eis a minha resposta à
questão.
MAKAROV: Pensemos agora
aos auditores que numa encruzilhada se perguntarão: “E então, mas como
verificar que Cristo era realmente aquilo que Ele dizia ser? Como posso ter a
certeza de que a Bíblia diz a verdade? Como posso me situar face a diversas
religiões? Qual será a minha resposta aos meus pais ateus ou aos meus
professores ateus, o que direi aos devotos de Hare Krishna que dançam nas
praças? Por que deveria vir a Cristo? Simplesmente porque o Padre Alexandre Men
ou Mark Makarov ou alguém mais pensa que a Bíblia diz a verdade? Como posso
saber se eles têm razão?
MIEN: Bom, no caso de
uma pessoa que já tenha uma ideia do que é a religião, a minha resposta poderia
muito bem vir a ser o quê disse: podemos acreditar em todas as religiões. Se
cremos que Deus Se revelou a Maomé porque fazer uma exceção para o fundador do
Cristianismo e rejeitar o que Ele disse? Se cremos que Deus Se revela, então
Ele o faz de diferentes maneiras a todos e a cada um em particular. E eu creio
que Deus está obrando em todos os grandes mestres e não existe possibilidade
para dizer: “Mas rejeitamos este Jesus Cristo”. Não, eles são todos verdadeiros
e isto quer dizer que Jesus diz a Verdade quando fala de Si-mesmo: “Eu e o Pai
somos Um” (Jo. 10, 30).
No entanto, no caso de uma
pessoa sem sensibilidade religiosa alguma, eu responderia então com as palavras
do Evangelho – lembrai-vos do que os Discípulos disseram a Natanael: “Vem e vê”
(Jo. 1, 46). Quer dizer, cabe a nós ver e sentir, experimentar (fazer a
experiência). Os matemáticos não podem demonstrar a beleza da Nona Sinfonia de
Beethoven ou de um grande quadro, ou da “Trindade” de Roublev. Devemos,
primeiramente, ouvi-lo, vê-lo, encontrar interiormente – dessa mesma forma
devemos buscar o Cristo e tentar encontrá-Lo. Sem este encontro, nenhum sistema
de provas não poderá convencê-lo, o sistema permanecerá esquemático e sem vida.
Cremos em Cristo não porque nos disseram que devemos crer, mas porque estas
palavras nos convidam a “vir e descobrir”.
A fé vem ao receber a
palavra, diz o Apóstolo Paulo. Lembrai-vos da reação dos samaritanos quando a
mulher lhes diz: “Eis um homem que me disse tudo que tinha feito”. Eles estavam
maravilhados, mas quando se dirigiram eles mesmos e que eles ouviram Jesus,
então concluíram: “Agora compreendemos, não pelo fato de nos teres dito, mas
por causa de nossa experiência pessoal” (Cf. Jo. 4, 42).
Eis a aproximação
científica, verdadeiramente científica. É um fato que a ciência sem a
experiência não pode avançar muito longe. No que concerne a crença religiosa, a
experiência tem um papel enorme. Trata-se, todavia, de uma experiência
interior, espiritual. Eis a realidade que os seres humanos devem fazer a
experiência. Se queremos exprimir uma opinião sobre tal realidade sem ter
tentado encontrá-la, só poderemos fundamentar nossa opinião sobre informações
parciais. Só podemos ver Jesus com o coração, não podemos aprender
cientificamente nada sobre Ele, por meios estritamente exteriores; o fato de
Ele ter verdadeiramente existido, Seu meio e por ai vai... São questões
importantes, mas secundárias à fé.
MAKAROV: O que dizer a
estas pessoas – e elas são numerosas – que absorveram a educação atéia a tal
ponto que ao nos escutar, elas pensam: “Seria muito bom que tudo fosse como
você diz, mas é claro que todo mundo sabe que não existe Deus algum!”
MIEN: Eu penso ao
contrário, todo mundo sabe precisamente o contrário. Como disse no início, o
número de pessoas que deixaram a Deus e se viraram a adoração de ídolos
demonstra que o mundo não pode existir sem Deus – incidentemente, Mao Tse-Tung
compreendeu muito bem isto. Deus é ponto de partida de tudo. Os seres humanos
vivem neste mundo somente porque creem num sentido do mundo. Albert Einstein
disse que aquele que não crê no sentido da existência não está apto à vida.
Logo, os ateus que dizem não crer no sentido da existência, nas profundezas de
suas almas, em seus sub-conscientes, creem, mas enterram suas crenças sob
outras etiquetas.
As pessoas têm sede de água
porque isto é uma necessidade – é um fato objetivo. Eles têm necessidade de
alimento – é um fato objetivo, como muitos outros – e não tem nada de
imaginário. Se as pessoas sempre têm sede de encontrar um sentido superior à
existência e venerar este sentido, de orientar suas vidas em função deste
sentido, isto quer dizer que esta necessidade não é uma patologia, mas a
condição normal da humanidade.
Quando olhamos para trás,
vemos que sempre, ao longo dos séculos, Deus estava presente de uma forma ou de
outra. Acabo de pensar no fundador do positivismo, Augusto Comte. Ele rejeitava
os valores superiores, embora não de forma agressiva, e ele falava de Deus como
qualquer coisa de desconhecível e ao sujeito do qual não podíamos dizer nada.
Ele morre de joelhos diante de um altar, mas este altar era a poltrona onde se
sentava a mulher que ele amava, que estava morta. Ele prodigalizava respeito e
veneração a esta poltrona. Ele foi, incidentemente, o primeiro a propor a ideia
e um templo dedicado à humanidade – o ‘grande ser’ – a parte da grandiosa na
humanidade, que deveria ser venerada. Se examinamos a história de todas as
pseudo-religiões, veremos então que este sentido do sublime é verdadeiramente
inextinguível, essencial à humanidade. (...)
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