Condenados a serem imortais

POPOVITCH Abba Justin
tradução de monja Rebeca (Pereira)


Os homens condenaram Deus à morte. Mas, Deus, no entanto, "condena", pela Sua Ressurreição, os homens à imortalidade. Ele lhes retribui seus golpes com beijos, suas injúrias com bençãos, sua morte com a imortalidade. Os homens nunca mostraram tamanho ódio por Deus ao crucificarem-No; e nunca Deus mostrou tamanho amor pelos homens ao ressuscitar. Os homens queriam fazer de Deus um mortal, mas pela Sua Ressurreição, Ele os torna imortais. O Deus crucificado ressuscitou, e Ele aniquilou a morte. Não há mais morte.

Pela Ressurreição do Deus-Homem, a natureza humana foi conduzida irrevogavelmente ao caminho da imortalidade, tornando-se terrível, mesmo para a morte: posto que antes da Ressurreição de Cristo, a morte era terrível ao homem, todavia após a Ressurreição do Senhor é o homem que torna-se terrível para a morte. Se o homem vive pela Fé no Deus-Homem ressuscitado, ele vive acima da morte. Ele torna-se invulnerável, mesmo para a morte. A morte torna-se o "escabelo de seus pés". "Ó morte, onde está o teu aguilhão? Inferno, onde está a tua vitória?" (cf. Cor. 15, 55-56). Assim, quando o homem morre em Cristo, ele depõe somente a vestimenta de seu corpo, a fim de revesti-la novamente no dia da segunda vinda.

Até a Ressurreição do Deus-Homem - Cristo - a morte era a segunda natureza do homem: a primeira era a vida e a segunda era a morte. O homem habituou-se à morte como qualquer coisa de natural. Mas pela Sua Ressurreição, o Senhor tudo mudou: agora é a eternidade que torna-se a segunda natureza do homem, algo de natural para o homem e que torna a morte anti-natural. Tal como até a Ressurreição de Cristo, era natural que os homens fossem mortais, assim também após a Ressurreição é a imortalidade que lhes passa a ser natural.

O pecado tornou o homem mortal e finito. Pela Ressurreição do Deus-Homem, ele torna-se imortal e eterno. Trata-se aí justamente do poder, da força e do pleno poder da Ressurreição de Cristo. Eis porque sem a Ressurreição de Cristo, não haveria Cristianismo. Dentre os milagres, a Ressurreição do Senhor é a maior. Todos os outros milagres provêm dele e se resumem nele. Dele provêm a fé, o amor e a esperança, e a oração e a piedade. Os Discípulos dispersados de Jesus na altura de Sua morte, retornam a  Ele próprio. Ao ver que Cristo havia ressuscitado do túmulo, o centurião romano confessa que Ele era verdadeiramente o Filho de Deus. Da mesma maneira, todos os primeiros cristão o tornaram porque Cristo havia ressuscitado; porque Ele havia vencido a morte. É justamente isto que não encontramos em nenhuma outra religião. É isto que demonstra de uma maneira única e não duvidosa que Jesus Cristo é o único verdadeiro Deus e Senhor em todos os mundos visíveis e invisíveis.

É graças à Ressurreição de Cristo, graças à Sua vitória sobre a morte que os homens tornaram-se, tornam-se e tornar-se-ão sempre cristãos. Toda a história do Cristianismo resume-se na história de somente um único milagre, o milagre da Ressurreição de Cristo, que está constantemente no interior dos corações dos cristãos, de dia em dia, de ano a ano, de século a século, até a segunda vinda.

O homem é verdadeiramente engendrado, não quando sua mãe o põe no mundo, mas quando crê no Cristo Salvador Ressuscitado; porque desde então é engendrado à vida imortal e eterna, enquanto que a mãe engendra seu filho para a morte, para o túmulo. A Ressurreição de Cristo é a nossa Mãe, a Mãe de todos os cristãos, a Mãe dos imortais. Pela fé na Ressurreição do Senhor o homem é engendrado de novo, ele é engendrado para a eternidade.

“Tudo é possível àquele que crê” (Mc. 9, 23)

Aquele que crê é aquele que de todo o seu coração, de toda a sua alma, de todo o seu ser, vive segundo o Evangelho do Senhor Jesus Ressuscitado.

Nossa fé é a vitória pela qual nós vencemos a morte, quer dizer a fé no Senhor Ressuscitado. “Morte, onde está o teu aguilhão?” e “o aguilhão da morte é o pecado” (I Cor. 15, 55-56). Pela Sua Ressurreição, o Senhor aniquilou o aguilhão da morte. A morte é uma serpente, o pecado o seu aguilhão. Pelo pecado, a morte introduz o veneno na alma e no corpo dos homens. Quanto mais numerosos são os pecados do homem, mais numerosos são os aguilhões pelos quais a morte introduz no homem o seu veneno.

Quando uma vespa pica um homem, ele utiliza todos os meios necessários para extrair de seu corpo o aguilhão da vespa. Da mesma forma, quando o pecado – este aguilhão da morte – pica o homem, o que ele deve fazer? É necessário que pela fé ele faça apelo ao Salvador, ao Cristo Ressuscitado, a fim de que Ele extraia de sua alma o aguilhão da morte. E Ele, em Sua grande misericórdia, o fará porque Ele é o Deus de misericórida e de amor. Quando muitas vespas se abatem sobre o corpo de um homem e o ferem com numerosos aguilhões, o homem permanece envenenado e morre. O mesmo acontece com a alma do homem; quando os aguilhões de numerosos pecados o ferem. Ele morre de uma morte que não tem ressurreição.

Vencendo nele próprio o pecado por Cristo, o homem vence a morte. Se um dia se passa sem que hajas vencido somente um dos teus pecados, saibas que estás um pouco mais morto. Mas, se vences um ou dois ou até mesmo três dos teus pecados, tornaste-te mais jovem; desta juventude que não envelhece, a juventude imortal e eterna! Não esqueçamos jamais: crer no Cristo Ressuscitado significa combater continuamente o pecado, o mal e a morte.

Que alguém creia verdadeiramente no Senhor Ressuscitado, isto demonstra que ele luta contra o pecado e as paixões; e se ele luta, é necessário que ele saiba que ele luta pela imortalidade e a vida eterna. Mas se ele não luta, vã é a sua fé! Pois se a fé do homem não for um combate pela eternidade e a imortalidade, o que ela é então?  Se Cristo não ressuscitou, isto quer dizer que o pecado e a morte não foram vencidos. E se estes dois não foram vencidos, porque creríamos em Cristo? No entanto, aquele que combate pela fé no Cristo Ressuscitado  contra cada um dos seus pecados, consolida gradualmente nele a consciência que Cristo verdadeiramente ressuscitou, que Ele despedaçou verdadeiramente o aguilhão da morte, que Ele pôs à morte verdadeiramente a morte sobre todas as frentes de combate.

O pecado corrompe gradualmente a alma do homem, aproxima-a da morte, a transforma de imortal em mortal, de incorruptível e infinita em corruptível e finita. Quanto mais o homem tem pecados, mas ele é mortal. Enquanto o homem não se ressente, ele próprio, enquanto imortal, é evidente que ele está completamente imerso nos pecados, em pensamentos mesquinhos, em uma consciência morta. O Cristianismo é um apelo ao combate até as últimas forças contra a morte, quer dizer até uma vitória definitiva sobre ela. Cada pecado representa uma recuada, cada paixão uma traição, cada vício uma derrota.

Não é bom admirar-se de que os cristãos também morrem de uma morte corporal, isto acontece porque a morte de corpo é uma semente. O corpo é semeado mortal, como nos diz o Apóstolo Paulo (cf. I Cor. 15, 42 e sg.) e germina, cresce e torna-se imortal. Tal como o grão que semeamos, o corpo se desfaz para que o Espírito Santo o vivifique e o consolide. Se o Senhor Jesus não tivesse ressuscitado em Seu Corpo, que ganho teria resultado? Ele não tivesse salvo todo o homem. Se o corpo não tivesse ressuscitado, por que razão Ele teria encarnado?

Se Cristo não tivesse ressuscitado, por que teríamos crido n´Ele? Eu devo reconhecer que não teria crido em Cristo se Ele não tivesse ressuscitado nem vencido a morte, nosso maior inimigo. Mas Cristo ressuscitou e nos fez dom da imortalidade. Sem esta verdade, o mundo não passa de uma exposição caótica de hediondas estupidezas. É somente pela Sua gloriosa Ressurreição que o nosso maravilhoso Senhor e Deus nos libertou do absurdo e do desespero. Pois sem a Ressurreição não há nem céu, nem sob o céu, coisa mais absurda que este mundo; não há coisa mais desesperante que esta vida privada de imortalidade. Eis porque não há, em todos os mundos, existência mais infortunada do que aquela do homem que não crê na Ressurreição de Cristo e na Ressurreição dos mortos (cf. I Cor. 15, 19). “Bom seria para esse homem se não houvera nascido” (Mt. 26, 24).

Para o nosso mundo humano, a morte é a maior provação, a mais terrível inumanidade. A salvação é justamente a liberação desta provação e desta inumanidade, e tal salvação só é concedida ao gênero humano pelo Vencedor da morte, o Deus-Homem Ressuscitado. Pela Sua Ressurreição é todo o mistério da nossa salvação que Ele nos revela. A salvação quer dizer que a imortalidade e a vida eterna são asseguradas ao corpo e à alma. De que maneira este prodígio foi obtido? Somente por uma vida divino-humana, uma vida nova, em e pelo Cristo Ressuscitado!

Para nós, cristãos, esta vida sobre a terra é uma escola onde aprendemos a nos assegurar a imortalidade e a vida eterna. Pois que utilidade teria para nós esta vida, se não pudéssemos por ela alcançar a vida eterna? Mas para que o homem ressuscite com Cristo é necessário que ele morra com Cristo e que Ele viva a vida de Cristo com sua própria vida. Se ele realiza isto, no dia da Ressurreição ele poderá dizer com São Gregório o Teólogo: “Ontem eu estava crucificado com Cristo, hoje eu partilho a Tua glória. Ontem eu estava pregado com Cristo, hoje sou crucificado con´Tigo. Ontem eu partilhava o Teu túmulo, hoje ressuscito con´Tigo.”

Em apenas algumas palavras recapitulamos os quatro Evangelhos de Cristo: “Cristo ressuscitou! Verdadeiramente ressuscitou!” Em cada uma destas palavras se encontra um Evangelho, e nos quatro Evangelhos se encontra a significação de todos os mundos de Deus, visíveis ou invisíveis. Todos os conhecimentos e todos os pensamentos do homem foram concentrados na aclamação pascal: “Cristo ressuscitou!” O júbilo da imortalidade comove todos os seres. E estes respondem com alegria e segurança: “Verdadeiramente ressuscitou!”

Sim, em verdade o Senhor ressuscitou! E tu és testemunha, eu sou testemunha, cada cristão é testemunha, começando pelos santos Apóstolos até a segunda vinda. Somente, em efeito, o poder do Deus-Homem pode conceder – e sempre concede e sempre concederá – a cada cristão – do primeiro ao último – o poder de vencer toda a mortalidade, e a própria morte; tudo o que é pecado e o próprio pecado, tudo o que é diabólico e o próprio diabo. Pois somente ao ressuscitar que o Senhor mostra e demonstra, de maneira mais persuassiva possível, que Sua vida é a vida eterna, que Sua Verdade é a Verdade eterna, que o Seu amor é o amor eterno, que a Sua bondade é a bondade eterna, que o Seu júbilo é o júbilo eterno. Ele mostrou e demonstrou que é Ele próprio que concede tudo isto a todos os cristãos de todos os tempos no Seu incomparável amor pelo homem.

Em suma, não há acontecimento tão somente no Evangelho como também em toda a história do gênero humano que tenha sido feito objeto de um testemunho tão poderoso, tão irrefutável, quanto a Ressurreição de Cristo. Sem sombra de dúvidas, o Cristianismo, em toda a sua realidade histórica, em seu poder e seu supremo poder histórico está fundamentado sobre o acontecimento da Ressurreição de Cristo, quer dizer sobre a Pessoa eternamente viva do Deus-Homem, de Cristo. Toda a longa e sempre miraculosa história do Cristianismo testemunha.

Pois se existe um acontecimento onde poderíam se resumir todos os acontecimentos, desde a vida do Senhor e dos Apóstolos e em geral todo o Cristianismo, este acontecimento em verdade é a Ressurreição de Cristo. Da mesma forma, se existe uma verdade onde poderiam se resumir as verdades neo-testamentárias, um milagre onde poderiam se resumir todos os milagres evangélicos, este milagre é, em verdade, a Ressurreição de Cristo. Pois é somente na luz da Ressurreição de Cristo que o Deus-Homem Jesus mostra em Seu maravilhoso esplendor Sua Face e Sua obra. É somente na Ressurreição de Cristo que todos os Seus milagres, todas as Suas verdades, todas as Suas palavras, todos os acontecimentos do Novo Testamento recebem sua plena explicação.

Até a Sua Ressurreição, o Senhor concede um ensinamento acerca da vida eterna, mas pela Sua Ressurreição Ele mostra que Ele próprio é verdadeiramente a Vida Eterna. Até a Ressurreição Ele concede um ensinamento sobre a Ressurreição dos mortos, mas pela Sua Ressurreição Ele mostra que Ele próprio é verdadeiramente a Ressurreição dos mortos. Até a Ressurreição Ele ensinou que a fé n´Ele faz passar da morte à vida, mas pela Sua Ressurreição mostra que Ele próprio vence a morte garantindo, desta maneira, aos defuntos a passagem da morte à Ressurreição. Sim, em verdade, pela Sua Ressurreição, o Deus-Homem Jesus Cristo mostrou e demonstrou que Ele é o único e verdadeiro Deus, o único verdadeiramente Deus-Homem em todos os mundos humanos.

E ainda mais: sem a Ressurreição do Deus-Homem não podemos explicar nem o apostolado dos Apóstolos, nem o martírio dos mártires, nem a confissão dos Confessores, nem a santidade dos Santos, nem o ascetismo dos ascetas, nem o milagre dos taumaturgos, nem a fé daqueles que crêem, nem o amor daqueles que amam, nem a esperança daqueles que esperam, nem o jejum daqueles que jejuam, nem a oração daqueles que oram, nem a doçura daqueles que são doces, nem o arrependimento daqueles que se convertem, nem a misericórdia dos misericordiosos, nem sorte alguma de virtude ou ascese cristã. Se o Senhor não houvesse ressuscitado, e se ressuscitando, Ele não tivesse cumulado Seus Discípulos de força vivificante e de sabedoria miraculosa, quem poderia ter reunido estes homens espantados e dispersados, quem poderia ter lhes dado audácia, força e sabedoria e como poderiam eles ter com tamanha audácia, com tamanha força e sabedoria, proclamado o Senhor Ressuscitado e caminhado com tamanho júbilo à morte por Ele?  E se o Senhor ressuscitado não os tivesse cumulado de Seu poder e sabedoria divinos, como poderiam eles ter aceso no mundo a chama inextinguível da fé neo-testamentária, eles, que eram homens simples e iletrados, sem riqueza nem instrução? Se a fé cristã não fosse a fé no Ressuscitado e por consequência no Senhor eternamente vivo e vivificante, o quê poderia ter inspirado os mártires o prodígio do martírio, os confessores o prodígio da confissão, os ascetas o prodígio da ascese, os anárgiros o prodígio do desinteresse, os jejuadores o prodígio do jejum e a continência e a cada cristão todas as sortes de prodígios evangélicos?

Tudo isto é verdadeiro e real: e para ti e para mim e para toda a existência humana. Pois o maravilhoso e dulcíssimo Senhor Jesus, o Deus-Homem Ressuscitado é a única existência  sob o céu pela qual o homem, sobre esta terra, pode vencer a morte, o pecado e o diabo e assentar-se na alegria e na imortalidade, em qualidade de concidadão do Reino Eterno do amor de Cristo. É por isso, pela Sua existência humana que o Senhor Ressuscitado é tudo em todos, em todos os mundos: Ele é que é belo, o que é bom, o que é verdadeiro, o que é amante, o que é amável, o que é divino, o que é sábio, o que é eterno. Ele é todo o nosso amor, toda a nossa Verdade, todo o nosso júbilo, todo o nosso bem, toda a nossa vida; Ele é a Vida Eterna em todas as eternidades e infinidades divinas.

É por isso que dizemos novamente, e mui frequentemente, e por numerosas vezes que CRISTO RESSUSCITOU!

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