IGREJA X RELIGIÃO


fonte: enoriaendrasei.gr
tradução de monja Rebeca (Pereira)


A igreja é uma realidade completamente diferente, diferente da religião. É um acontecimento que ocorre no interior de um relacionamento comunitário.


No Pireu, no domingo, 20 de outubro, como parte do programa do ΕΝΟΡΙΑ εν δράσει (Paróquia em ação), houve um raro encontro entre duas pessoas muito importantes - representantes da teologia ortodoxa mundial, na "Hospedaria Paroquial" da Igreja da Anunciação.

Sua Eminência Reverendíssima, o Metropolita de Montenegro e Litoral, o sr. Amfilohije Radovic e o professor emérito de filosofia da Universidade Pantheon e escritor Christos Yannaras participaram de uma conversa interessante que abordou várias questões.
A conversa foi moderada pelo arcipreste Espiridão Cimuris, teólogo.

IGREJA, VERDADE E EXPERIÊNCIA
A primeira parte da conversa foi relativo à Igreja como a concebemos de nossos olhos, com muitos problemas, mas também esperança.

Os tópicos discutidos foram a missão da Igreja, Igreja & religião, a Igreja como o Corpo de Cristo.

Yannaras salientou que tais questões eram/são dolorosas, enfatizando que deixamos de distinguir a Igreja da religião.

A religião é um acontecimento centrado no indivíduo.

Escolho uma religião que tem certos comprometimentos, tem moral, cumpra-a ou não. As coisas são construídas na religião para proteger o ego. A Igreja é uma realidade completamente diferente, diferente da religião. É um acontecimento que se realiza como um relacionamento comunitário.

Para a Igreja, Deus é uma comunidade tri-una de personalidade, Pai, Filho e Espírito Santo. O mistério da verdadeira existência está na definição de Deus nas Escrituras Sagradas: “ "Deus é amor". Esse é Seu jeito de ser/existência.

A Santíssima Trindade é tudo, apontou o Metropolita de Montenegro, em contrapartida. É a raiz da existência, a própria existência mesmo. Tudo nela encontra apoio, sobrevivência, a maneira correta de ser/existir.

Na Divina Liturgia, nas “Bem-Aventuranças...” a Igreja realmente existe como um acontecimento, não como uma ideologia, como uma religião.

Isso é o Reino, e a Igreja é o Corpo de Cristo. A Igreja convida todos a se tornarem participantes do Mistério.

A igreja é um chamado à transformação através do arrependimento, um chamado à mudar de vida. Abrindo a própria existência à experiência do mistério de Deus como Amor. A grandeza de Cristo está em Seu sacrifício, no amor sem limites. Ele se entrega e transfere continuamente o mistério do amor divino para a Igreja como Seu corpo e sangue. Através do Corpo e Sangue de Cristo, nós nos conectamos com Deus e nos conectamos uns com os outros. É uma comunhão/comunidade da eternidade, esse encontro com Cristo.

E esse é o Mistério da Igreja, continua o Metropolita. E é uma grande obra de Deus o fato desse Mistério persistir hoje no mundo. Apesar de todas as tentações e perseguições à Igreja, esse mistério é concedido a todo o Universo.

Como o sr. Yannaras apontou, nossa Igreja viveu seu período mais autêntico durante a ocupação turca, quando não havia lugar para se pregar, somente partilhar. E era tudo partilha.

Acender uma vela em uma casa, amassar uma prósfora, jejuar, benzer algo, ir à Comunhão – ato central social. Tudo isso não eram fontes de lucro, é óbvio. Compartilhar é um ato, não uma decisão ideológica.

É uma grande bênção de Deus sermos membros do Corpo de Cristo, frisou o Metropolita de Montenegro. É uma unidade baseada na própria existência do mundo e na existência de Deus.

CONCILIARIDADE
Outro tópico de conversa foi sobre conciliaridade como modo de vida na Igreja.

Este modo de vida é Deus-humano, enfatizou Sua Eminência, repetindo as palavras de seu Ancião e Abba, São Justin Popovic. O modo de vida de Cristo é o único modo de vida para o homem.

A primeira queda de Adão é a negação da palavra vivificante de Deus. É o enriquecimento do mundo criado (existência criada) sem Deus e Sua palavra.

Yannaras observou que as coisas estão relacionadas. Quando dizemos que a fé se tornou persuasão, o aprendizado imediatamente se torna um aprendizado racional. A persuasão é baseada em evidências. Então ensinar não é pedagogia, liderança, mas lavagem cerebral.

Conhecimento não é apenas quando entendo alguma coisa. A iluminação deve acontecer primeiro, o que significa que compartilho experimentalmente o que sei.

Essa é a diferença junto ao homem ocidental - se entendo, logo existo. É uma cultura diferente. Pegamos isso e tentamos aplicá-lo também na Ortodoxia.

O Concílio na Igreja já foi uma expressão de paternidade. Hoje chamamos os sacerdotes de pais, mas não nascemos espiritualmente.

É por isso que são realizados concílios, que são a assembléia geral de mais hierarquias. Paternidade significa nascimento, avivamento.

No Concílio, certa vez, participou um pastor erudito, São Espiridão, e tomando um tijolo mostrou tudo, lembrou Yannaras. Pelo fato de ele (o Santo) saber como é necessário fazer nascer/dar à luz.

Como encontrar tais coisas novamente e dizer tais coisas. E como procuramos por elas como procuramos saciar nossa sede. Pois que, durante algum tempo, os bispos estavam cientes dessa paternidade. Hoje, o Concílio é um órgão administrativo. As coisas estão relacionadas. Quando a verdade não é pregada, mas transmitida, quando o conhecimento não é autoconfiança, mas iluminação, a paternidade pode fazer seu trabalho, o Concílio pode fazer seu trabalho.

Esse conflito entre o conhecimento e a vida da Igreja como verdadeira iluminação e transformação/transfiguração estava especialmente presente no século XIV, na época de São Gregório Palamas, observa o Metropolita de Montenegro. E em seu ensinamento, que era o ensinamento da Igreja, confrontou-se com o ensinamento do Ocidente.

Nesta ocasião, o Metropolita enfatizou:

A comunicação com Deus não é uma ideologia, mas é essencial. Deus, tal como a própria vida, Se dá em comunhão/comunidade (entrar em um relacionamento).

CONCILIARIDADE & PRIMAZIA
A discussão enfocou, doravante, o serviço do Primaz entre iguais dentro de uma existência conciliar.

O serviço do Primaz no Concílio é o serviço de relações, observou Yannaras.

Com o tempo, ele foi incumbido de ser aquele que garante a unidade. Estar lá e servir à unidade. Celebrar a unidade do episcopado.

Como exemplo de um desses Primazes (entre iguais), Sua Eminência fez menção do bem-aventurado Patriarca Sérvio Paulo.

Nos Concílios/Sínodos/Reuniões da hierarquia, ele não comandava, antes se dava em sacrifício. Tal Primaz é exemplo de verdadeira paternidade.

Consequentemente, o sr. Yannaras também se referiu à pessoa do bem-aventurado Patriarca Ecumênico Dimitrios.

Dimitrios permaneceu lembrado como o grande patriarca. Bênçãos e sorrisos por toda parte. Sua presença quebrou ossos.

Precisamos de um retorno aos três primeiros séculos da igreja, continuou o Metropolita de Montenegro, período em que a Igreja se encontrava sob perseguição. A Igreja sempre teve o espírito de martírio em si mesma.

E se hoje Ela realmente deseja ser Una, Santa, Católica e Apostólica, antes de tudo tem de se liberar do ethno-flilismo, aspirações humanas e Primazes com perfis de Papas. Deve retornar a si-própria e ser tal como era nos três primeiros séculos. A verdadeira conciliaridade/universalidade/catolicidade é aquela dos Atos dos Apóstolos e da vida da Igreja no dealbar dos séculos. Primaz no espírito de sacrifício, e não de poder.

CONCLUSÃO
Em guisa de conclusão, o sr. Yannaras fez menção de uma citação do livro "História Lausíaca", que diz que a linguagem da Igreja é apocalíptica quando mostra desprezo. Uma linguagem que não se escraviza somente à lei e às restrições pode tudo salvar.

Fez também uma declaração pessoal ao Metropolita Amfilohije, observando emocionalmente que diante de seus olhos se encontrava tal Ancião e verdadeiro testemunha. Testemunha este de acontecimentos no Kosovo, o que o convida à esperança. Yannaras o agradece.

Sua Eminência também mencionou seu Ancião Abba São Justin Popovic, que apesar de ter estudado na Sérvia, Inglaterra, Rússia e Grécia, aprendeu mais com uma velhinha aos pés do Partenon. Ela o encorajou a escrever os 12 tomos de “A Vida dos Santos”.

Eis o mistério da Igreja, paternidade e maternidade na Igreja.

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