Sobre a Unidade da Igreja

JEVTITCH Vladika Atanasije
tradução de monja Rebeca (Pereira)


“JUNTOS, CELEBRAMOS O ESPÍRITO SANTÍSSIMO!”
           
Por volta do ano 1991, altura em que o Santo Sínodo (já estando o Patriarca German pregado ao leito, como nosso Patriarca Pavle nos dias de hoje) decide pela graça de Deus, com seriedade sérvia e responsabilidade pastoral, que nosso lamentável cisma na América devia ser resolvido e ultrapassado, escrevemos que a Diáspora fora por muito tempo o problema mais complexo de toda Ortodoxia, sendo por esta razão incluído na agenda do futuro Grande Concílio da Igreja Ortodoxa. Dizemos também, naquela altura, que a experiência da Diáspora na Igreja, tanto com os judeus no Antigo Testamento como com os cristãos no Novo, quer dizer a Igreja, não é algo de mal em si. Mas sim um desafio tanto inevitável quando providencial ao Israel de Deus, ambos, o antigo como o novo, quer dizer, tanto o povo judeu como a Igreja de Cristo. A Diáspora nos faz lembrar, enquanto comunidade do povo de Deus na história a caminho do Reino dos Céus, da jornada e o estado crucificado da Igreja neste mundo e nesta época: “estamos neste mundo mas não somos dele”; estamos na Cada de Deus, mas a Dispensação – a estruturação da Casa de Deus que é a Igreja – ainda está em processo. O Reino de Deus já está presente na Igreja, mas enquanto cristãos estamos ainda simultaneamente na caminho que conduz ao Reino, a Pátria Celeste de todos nós.

 A Diáspora coloca duas importantes questões à Igreja Ortodoxa: a questão da verificação de nosso correto entendimento eclesiológico, nova experiência viva da Igreja e a questão da missão da Igreja no mundo. Em tempos recentes, a Diáspora nos faz lembrar e de sua forma nos obrigava, a não nos esquecermos a importante missão da Ortodoxia no mundo moderno, que é possível somente pelo franquear de nosso parâmetro nacionalista ao qual nos encontramos presos pelo perigo da isolação. A Diáspora no Ocidente foi e continua sendo um território missionário da Ortodoxia. Tanto a América do Norte como a América do Sul, em particular, permanecem territórios missionários.

A Diáspora apresenta um problema vital de Eclesiologia Ortodoxa a todas as Igrejas Ortodoxas Autocéfalas – o qual tivémos aparentemente, sob a influência da recente guerra e a história política nacional, começa a se fazer esquecer. A saber, o princípio fundamental de organização da antiga Igreja do Oriente – a Igreja nasceu no Oriente e os Evangelhos foram dispersados pelo mundo a partir do Oriente, tal como São Basílio o Grande e os Padres do Segundo Concílio Ecumênico nos recordam – sempre foi geográfico; mas não por nacionalidade ou estado, mas regional, local, quer dizer, concretamente vivido. Ao ouvirmos, nos últimos séculos, a palvra “Igreja Local” (ou ainda como alguns teólogos católicos dizem com malícia: “Igreja do Estado”). Na antiga Igreja, todavia; a Igreja local significa a Igreja de um determinado lugar – da cidade, território, ou terra, sem levar em conta a nacionalidade, a raça ou a cor dos fiéis (crentes) que nela vivem. Esta compreensão tem duas importantes consequências. Em primeiro lugar, disto deriva um dos mais imutáveis e fundacionais cânones da Igreja antiga, formulado no Primeiro Concílio Ecumênico, no Cânone 8: “Dois Bispos não podem estar numa única cidade”, ver também o 35º Cânone Apostólico e o 16º Cânone do Primeiro-segundo Concílio). Este único Bispo numa cidade (usualmente incluíndo suas vizinhanças) era o Bispo para todos os fiéis desta cidade e área, sem levar em conta o caráter étnico e outras composições...

Na antiga história da Igreja Ortodoxa e das Igrejas Ortodoxas, dioceses nunca sobrepuseram sua co-exitência no mesmo território geográfico. O estabelecimento de duas ou mais Igrejas Diocesanas na mesma cidade ou mesma área poderia ser uma falta de sentido eclesial por chegar a ser uma negação do fato de que a Igreja de Cristo é Una e Indivisa. Existiam exceções em raras instâncias, como por exemplo no século sétimo quando o Arcebispo de Chipre, em virtude da invasão de bárbaros, foge junto com seu clero e o povo para a região da Ásia Menor; a Kizik (próximo a Dardanelos), e organizam por si próprios uma Igreja separada no território do Patriarcado de Constantinopla, mas isto foi permitido somente até a liberação do Chipre, que ocorreu logo depois. Ou ainda em outra instância, modelada logo após a formada; quando a Igreja Sérvia permite que refugiados russos organizem-se por si próprios com seus clérigos e povo no território do Patriarcado Sérvio (com sede em Sremski-Karlovci).

Em nossa proposta de 1991 destindada a superar o cisma na América, escrito e adotado naquele tempo com a bênção do Santo Sínodo, foi sugerido e aceite pela Assembléia que  relação litúrgica, concelebração eucarística-canônica e comunhão fossem restabelecidos na Diáspora, mas que a justaposição das paróquias e Dioceses devesse permanecer ainda temporariamente, quer dizer, que a unidade administrativa não seria restabelecida imediatamente.

A partir disto não podemos e não devemos concluir que tal estado das coisas, permitido a continuar em nossa Diáspora somente através de economia pastoral, deve se fazer permanente e considerado normal. Pelo contrário, tal situação deveria ter sido resolvida há muito tempo atrás, e tanto a plena unidade canônica como administrativa estabelecida através da restruturação das Dioceses, em uma unidade episcopal – Diocese, sob um Bispo que esteja em unidade litúrgica e canônica com os outros Bispos Ortodoxos (neste caso de nosss Igreja Autocéfala Sérvia, até uma re-estruturação e uma unidade litúrgica cheia-de-graça e canônica-administrativa num nível pan-Ortodoxo é estabelecida geograficamente e não de acordo com o “princípio de nacionalidade”).

Graças a Deus, e devido aos contínuos esforços de nosso Santo Patriarca e Assembléia, justamente neste mês de maio, pela ocasião da Santa Assembléia dos Bispos de nossa Igreja, no dia da festa de São João Evangelista, o Teólogo, 21/8 de maio, esta unidade litúrgica-canônica e administrativa foi finalmente realizada, e devemos agradecer com todo coração, alma e mente ao nosso Pastor-Mor – Cristo o Salvador e o Espírito Santo Inspirador, o Consolador (Paráclito); que isto tenha sido aceito por todos os nossos Bispos, tanto aqueles na América como todo o resto dos membros da Santa Assembléia dos Bispos.

Nunca houve, e especialmente agora, não existe nenhuma razão eclesial, ortodoxa ou sérvia que o passado estado temporário de desunião – por não estar sob um Bispo em uma região – deve continuar por mais tempo. Quem quer que queira trazer em questão o valor eclesiológico e fortalecimento da igreja desta decisão pela Assembléia anual, demonstrará somente sua pequenez  mente obtusa, receio pessoal ou comunitário e auto-centralização, sua intolerância não cristã e anti-eclesial e numa análise final, sua aversão destrutiva à Igreja pelos seus irmãos. O cisma destruidor da alma, que o santo Abba Justin, com lágrimas e piedosas lamentações costumava chamar, o cisma que traz veneno e afogamento as almas de nossos irmãos de (mesma) fé e sangue, é passado, sanado, com traço algum que possa ainda permanecer.

Nesta decisão anual unificada e unânime de toda Assembléia dos Bispos não há “vitória” ou “derrota”, não há “vencedores” ou “vencidos”, porque isto demonstra uma consciência eclesial-construtiva, uma consciência ortodoxa e um fraterno e salvífico amor em Cristo nosso Senhor para com todos nós.

Nossos irmãos sérvios na América, verdadeiramente eclesiásticos e ortodoxoss, através desta união eclesial-construtiva e amor, pelo ato de sua plena unidade em Cristo pela graça do Espírito Santo para a glória de Deus Pai e pela nossa salvação, também estão dando um exemplo aos outros cristãos ortodoxos. Porque, tal como dizia o santo Hierarca Nikolaj (Velimirovitch) na América, há 50 anos atrás, o dia está chegando em que a plena unidade e a atividade missionária da Ortodoxia no Novo Mundo se fará manifesta a nós. E esta verdadeira atividade eclesial e missionária apareceu através deste acontecimento na América e na Igreja de São Savas e São Nikolaj, na Igreja dos Neo-Mártires, Hierarcas e fiéis de nosso povo que carrega a cruz.

“É o dia da Ressurreição, irradiemos de alegria nesta solenidade, e abracemo-nos uns aos outros; chamemos irmãos mesmo aqueles que nos odeiam! Perdoemos tudo por causa da Ressurreição!”

Nossos irmãos russos também criaram recentemente esta unidade (exceto para um pequeno número de indivíduos, um pequeno grupo envenenado com ódio), e nós sérvios os ajudamos a atingirem esta meta, por nos termos tornado para eles um modelo de reconciliação e unidade. Que o Senhor conceda que sejamos um modelo a outros ortodoxos, manifestando a natureza conciliar-católica da Igreja Ortodoxa de Deus, que através de sua plena unidade liturgo-canônica revela sua essência Litúrgica e Missionária na unidade da fé e na comunhão do Espírito Santo, tal como confessamos na Divina Liturgia antes da Comunhão de todos ao Pão dos Céus e ao Cálice da Vida Eterna.

De acordo com o salmista inspirado de Deus: “Oh, quão bom e quão suave é que os irmãos vivam em união!” Devemos todos de uma só voz e de um só coração glorificar e celebrar com hinos o Nome todo-venerável da Trindade Santa, a Assembléia Eterna – o Arquétipo da Unidade da Igreja. E então é que podemos comungar de um Único Pão e um Único Cálice, e visivelmente confessar e anunciar que somos membros vivos do Corpo Único de Cristo, o Deus-Homem e Salvador de todos nós, bem como de todo mundo (I Cor. 10:16-17).

No entanto, podemos acrescentar que nesta Santa Assembléia a unicidade de espírito e mente dos Padres de nossa Igreja revelou que não mais se faz necessária a menção de questões inapropriadas do tão chamado “antigo” e “novo” modo de celebrar, por ter sido dito neste encontro que todos servimos a único e mesmo Divino Serviço, mesmo apesar de haverem variações em alguns detlhes, que sempre houveram e existem na viva e vivificante Igreja de Cristo, desde o Oriente, por todos os tempos, tal como só existe um Evangelho de Cristo mesmo apesar de haverem quatro Evangelistas, e neles, da mesma forma que nas Liturgias Ortodoxas – e existem quatro dentre eles – aparece uma sinfonia polifônica e uma polifonia sinfônica do Espírito Pentecostal, ardente Graça do Espírito, o Confortador da Igreja, Que “nos chama à unidade”.

A unidade da Igreja, na unidade plena de graça de celebração e comunhão na Divina Eucaristia, e a unidade canônica de administração, onde “tudo é feito decentemente e com ordem” (I Cor. 14:40), desde o Pentecostes até o dia de hoje, e de Jerusalém à América, sempre foi um dom e um acontecimento da presença e da ação do Espírito Santo – na Igreja dos Apóstolos e dos Padres, dos Mártires e nos fiéis sucessores do Cordeiro de Deus, Comunidade em Único Espírito, a Casa do Deus Vivo, Pilar e Fundamento de Verdade, de salvação, de Ressurreição, de Vida eterna.

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