A “perfeição” original

LARCHET Jean-Claude


Deus, embora seja o “Criador de todas as coisas visíveis e invisíveis”, não pode ser considerado como o autor das doenças, do sofrimento e da morte. Os Padres são unânimes em afirmá-lo. Na sua homilia “Deus não é a causa dos males”, São Basílio diz: “É uma loucura julgar que Deus é o autor dos nossos males; uma blasfêmia [...] destrói a bondade de Deus” 1. “A doença não é […] obra da mão de Deus” 2. “Deus fez o corpo, não fez a doença, tal como fez a alma mas de modo algum fez o pecado” 3. É evidente, também, que “Deus não fez a morte” 4. Àqueles que, à afirmação bíblica da criação do homem à imagem de Deus, fazem objeção a nossa vida, o caráter doloroso da nossa condição, a nossa disposição para sofrer todas as espécies de doenças corporais e psíquicas, São Gregório de Nissa responde: “O caráter anormal das condições atuais da vida humana não basta para provar que o homem nunca esteve na posse de bens (relacionados com a imagem de Deus). Com efeito, sendo o homem obra de Deus, que se inspirou na Sua bondade para trazê-lo à vida, ninguém em boa lógica, poderia persuadir-se de que tal ente, que deve a sua experiência àquela bondade, havia sido imerso em males pelo seu Criador. Há uma outra causa para a nossa condição presente e para a privação que nos despojou de um estado mais invejável” 5. “Fundar-se sobre os sofrimentos do corpo que vêm necessariamente enxertar-se no caráter inconsciente da nossa natureza (atual) para chamar a Deus autor dos males, ou recusar-lhe absolutamente o título de criador do homem, a fim de não lhe imputar a responsabilidade dos nossos sofrimentos, denota a maior das estreitezas de espírito  [...]” 6. São Máximo, o Confessor, sublinha que “Deus, criando a natureza humana, não introduziu nela [...] a dor” 7, e que a passibilidade, a corrupção e a morte que o homem conheceu mais tarde provieram d´Ele 8. São Gregório Palamas, por sua vez, afirma: “Deus não criou a morte, nem as doenças, nem as enfermidades” 9, “Deus não criou a morte da alma nem a morte do corpo” 10; “esta morte do corpo, Deus não a deu, não a fez, não ordenou que ela exista 11. E nem é, também, o autor das doenças corporais” 12. O autor do livro da Sabedoria ensinava já: “Deus não fez a morte, a perdição dos vivos não Lhe dá nenhuma alegria. Porquanto Ele tudo criou para a existência; e todas as criaturas têm em si a salvação. Não há nelas nenhum princípio de morte” (Sb. 1, 13-14).

O autor inspirado do Gênesis revela que a criação de Deus é na origem inteiramente boa (cf. Gn. 1, 31) e os Padres ensinam, unanimemente  que o próprio homem, no estado original da sua natureza, ignorava toda a doença, toda a enfermidade, toda a dor, toda a corrupção 13. “O homem vivia nas delícias do paraíso [...] na posse da integridade das suas faculdades, no estado natural em que havia sido criado”, nota São Doroteu de Gaza 14. Ele conhecia “no seu corpo uma saúde perfeita”, afirma Santo Agostinho 15. E São João Crisóstomo: “Se quereis saber qual era o nosso corpo ao sair das mãos de Deus, vamos ao paraíso e vejamos o homem que Deus aí havia posto. O seu corpo não estava submetido [...] à corrupção; semelhante a uma estátua que se retira da fornalha e que brilha do mais intenso fulgor, ele não sentia nenhuma das enfermidades que nele atualmente reconhecemos” 16. E São Gregório de Nissa faz notar que “a doença ou a deformidade não nasceram desde o início com a nossa natureza” 17; o sofrimento físico, “as provações do corpo que fazem parte da nossa condição, as numerosas doenças”, a humanidade, “na origem, não as conheceu” 18. “O homem, escreve ele ainda, não tinha em si próprio por natureza, nem como propriedade essencial acrescida à natureza, a capacidade de sofrer [...] na altura de sua origem primeira  [...], mas foi mais tarde que se insinuou nele a natureza susceptível de sofrer” 19. A ausência de sofrimento e a incorruptibilidade têm de se contar entre os numerosos bens de que originalmente era possuidor 20. “Aquele que considera as provações do corpo que fazem parte da nossa condição, as numerosas doenças que na origem a humanidade não conheceu, chorará ainda mais lágrimas ao comparar a felicidade [original] e o sofrimento [atual], os males [hoje suportados] e os bens [anteriormente possuídos] 21. São Máximo o Confessor, por seu lado, escreve: “O primeiro homem, tomando de Deus o ser, veio à existência [...] livre de pecado e de corrupção, pois nem o pecado nem a corrupção foram criados com ele” 22; “a mudança para o susceptível de sofrer, a corrupção e a morte [...], o homem não a tinha no princípio” 23.

Esta dupla afirmação de que Deus não criou a morte e de que o homem era, no seu estado original, incorruptível, implica logicamente que o homem, neste primeiro estado da sua natureza, era, também, imortal. Numerosos textos patrísticos parecem, com efeito, indicá-lo 24.

Mas, olhando mais de perto, a concepção dos Padres demonstra, neste ponto, ser mais matizada.

Apoiando-se sobre a afirmação escriturística de que “Deus formou o homem do pó da terra” (Gn. 2, 7), alguns deles, com o fito de sublinhar o que distingue o criado do incriado, não hesitam em afirmar que o corpo do homem era, na sua origem primeira e segundo a sua natureza própria, um composto instável, corruptível e mortal. “O homem era mortal segundo a natureza do seu corpo”, afirma Santo Agostinho 25. “Por natureza, o homem é mortal pois é tirado do nada”, escreve Santo Atanásio de Alexandria 26 que afirma ainda que no princípio os homens “eram de uma natureza corruptível” 27. São João Crisóstomo frisa que no paraíso, o homem, embora não sentindo nenhuma das tristes necessidades, estava “revestido de um corpo mortal” 28. Os Padres matizam amiúde os termos que se expressam, dizendo que o homem foi criado “para a incorruptibilidade” 30, ou que era constitutivo da sua natureza tender a participar da imortalidade divina 31, ou, ainda, falam da incorruptibilidade e da imortalidade “prometidas” 32 significando que estavam desde logo definitivamente adquiridas como seria o caso se fossem propriedades inerentes à sua própria natureza.

É que a incorruptibilidade e a imortalidade do primeiro homem eram devidas exclusivamente à graça divina. Logo após ter criado o homem do pó da terra, Deus, diz o Gênesis, “ insuflou-lhe pelas narinas o sopro da vida, e o homem transformou-se num ser vivo” (Gn. 2, 7): neste sopro os Padres viram a alma, mas também o Espírito divino 33. É por estarem penetrados da energia divina que a alma e o corpo do homem possuíam qualidades sobrenaturais. Assim, São Gregório Palamas nota que a graça divina “completava através de benefícios muito numerosos a insuficiência da nossa natureza” 34. Era devido a esta graça que o corpo e a alma podiam ser completamente saudáveis. “Nós estávamos ao abrigo da doença […] mercê dos dons recebidos na criação”, sublinha São Basílio 35. É também por esta graça que o corpo era tornado incorruptível e imortal 36. Assim, Santo Agostinho acentua que o homem “era mortal segundo a natureza do seu corpo, mas imortal por graça” 37. Santo Atanásio fala do homem dotado de uma “vida imortal”, enquanto criatura “ possuindo os dons de Deus e o poder próprio que lhe advém do Verbo do Pai” 38, e frisa que “os homens eram de natureza corruptível, mas [que] pela graça da participação no Verbo” podiam “escapar a esta condição da sua natureza” 39, já que, “por causa do Verbo que estava presente neles, a corrupção da natureza não se aproximaria deles” 40.

Devido a esta graça, Adão achava-se, pois, numa condição muito diferente não só da dos outros seres vivos da natureza 41, como também da condição humana que atualmente conhecemos 42. Esta condição privilegiada, superior, que é chamada “paraíso” 43. É para indicar este acesso, por graça, a uma condição superior, que os Padres, comentando o texto do Gênesis (2,8), sublinham que o homem não foi criado no paraíso, mas foi aí colocado por Deus 44, e distinguem claramente o paraíso do resto da terra 45. Esta condição dizia respeito não apenas à alma, mas também ao corpo 46. São Máximo fala, assim, da “diferença de constituição do corpo humano de antes da queda de nosso primeiro pai Adão em relação com a que vemos manter-nos agora sob o império dessa queda” 47. Os Padres, embora sublinhando o fato de não nos ser, de nenhum modo, possível conceber essa condição original a partir do estado decaído em que nos encontramos presentemente 48, consideram que se tratava de uma condição próxima do estado angélico 49. Segundo São Gregório de Nissa e São Máximo em especial, o corpo do primeiro Adão não tinha a materialidade e a espessura que tem atualmente 50; a sua natureza era mais a do corpo ressuscitado que evoca São Paulo em I Cor. 15, e há que notar a este respeito que os Padres vêem no estado que se segue à ressurreição uma reintegração no paraíso 51.

Contudo, o homem, tendo sido criado livre, dependia da sua vontade conservar ou não esta graça e, portanto, permanecer nesta incorruptibilidade e nesta imortalidade que ela lhe conferia, ou, pelo contrário, perdê-las ao rejeitá-la 52. Assim, quando os Padres afirmam que o homem foi criado incorruptível e imortal, eles não pretendem dizer que ele não podia corromper-se ou morrer, mas sim que ele detinha por graça e por livre escolha a possibilidade de se não corromper nem morrer. Para que a sua incorrutibilidade e a sua imortalidade permanecessem e lhe fossem dadas como propriedades definitivas, era necessário que o homem conservasse a graça que lhe havia sido dada por Deus, se mantivesse unido a Ele apoiando-se no mandamento que lhe havia sido proposto para o efeito (cf. Gn. 2, 16-17-53) 54. Escreve São Gregório Palamas: “Na origem, o homem não era apenas uma criatura de Deus, mas era também seu filho no Espírito: esta graça foi-lhe concedida ao mesmo tempo que a alma pelo sopro vivificante (cf. Gn. 2, 7); concedia como penhor: se o homem tivesse observado o mandamento apegando-se a estas garantias, ele teria podido beneficiar, por elas, de uma união ainda mais perfeita com Deus e tornar-se co-eterno a Deus, revestido de imortalidade” 55.

Compreende-se, pois, que os Padres digam frequentemente que o homem, na origem e até ao pecado, não era, a bem dizer, nem mortal nem imortal. São Teófilo de Antioquia escreve: “Mas dir-nos-ão: O morrer não estava na natureza do homem? De forma alguma. Era, pois, imortal? Também não o afirmamos. Vão-nos replicar: Então não era nada? Não é isso igualmente o que sustentamos. É assim: por natureza, o homem não era nem mortal nem imortal. Se tivesse sido criado imortal desde o princípio, teria sido criado deus. Por outro lado, se tivesse sido criado mortal, parecia que Deus fosse a causa de sua morte. Portanto não foi criado nem mortal, nem imortal, mas capaz de ambas as coisas. Assim, inclinava-se para a via da imortalidade, seguindo o mandamento de Deus? Daí lhe adviria a imortalidade como recompensa, tornando-se deus. Virar-se-ia para as obras de morte, desobedecendo a Deus? Ele mesmo se tornaria a causa da sua própria morte. Com efeito, Deus tinha criado o homem livre e senhor de si próprio” 56. Santo Agostinho escreve: “Até o pecado, o corpo humano podia ser qualificado num certo sentido como mortal e, noutro sentido, como imortal; mortal porque podia morrer; imortal porque podia não morrer” 57. E Santo Atanásio de Alexandria nota no mesmo sentido: “Sabendo que a vontade livre dos homens podia inclinar-se para um lado ou para o outro, [Deus] tomou a dianteira e fortificou por uma lei e num lugar determinado a graça que lhes havia sido dada [...]. Desta forma, se eles guardassem a graça e permanecessem na virtude, teriam no paraíso uma vida sem tristeza, nem dor, nem preocupação, para além da promessa da imortalidade nos Céus. Mas se transgredissem esta lei, eles saberiam que a corrupção segundo a natureza os esperava na morte, que não viveriam mais no paraíso, mas seriam postos fora para morrer e permanecer doravante na morte e na corrupção” 58. São Gregório Palamas vê mesmo no mandamento divino um meio dado por Deus ao homem para lhe evitar a corrupção e a morte bem como simultaneamente, para lhe preservar a liberdade 59, e sublinha que a imortalidade e a morte, a incorruptibilidade e a corrupção dependiam de fato da escolha do homem 60, pois Deus tendo criado o homem livre, não podia impedir que ele escolhesse o que faria e em que se tornaria 61.

NOTAS
1.    Homilia: Deus não é a causa dos males, 2, PG 31, 332B.
2.    Ibid., 6, 344 A.
3.    Ibid., 6, 344 B.
4.    Ibid., 7, 345 A.
5.    Discurso catequético, v, 8-9. Cf. também ibid. 11 e VII, 4. Tratado da virgindade, XII, 2.
6.    Id., Discurso catequético, VIII, 15.
7.    Questões a Thalassios, 61, PG 90, 628 A.
8.    Ibid., 41, PG 90, 408 C.
9.    Homilias, XXXI, PG 151, 396 B. Cf. 388D.
10. Capítulos físicos, teológicos, éticos e práticos, 51.
11. Cf. ibid., 47.
12. Homilias, XXXI, PG 151, 396C. Cf. 388 B.
13. A palavra “corrupção” (phtora) que surgirá com frequência no decurso deste estudo, tem dois significados: designa, por um lado, a dissolução do corpo após a morte, e, por outro, toda espécia de alteração do corpo (e, por extensão, da alma). De acordo com este segundo significado, pode aplicar-se às doenças, aos sofrimentos, à fadiga... Cf. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, III, 28.
14. Instruções, I, 1. Cf. ABBA ISAÍAS, Coletânea ascética, II, 2.
15. S. AGOSTINHO, A Cidade de Deus, XIV, 26.
16. Homilias sobre as estátuas, XI, 2. Cf. Homilias sobre o Gênesis, V, 1 e 4: “Embora revestido de um corpo, o (homem) não lhe sofria as duras necessidades.” Homilias sobre o Gênesis, XIV, 1: Adão e Eva, “embora revestidos de m corpo, não lhe sentiam as enfermidades [...]. A sua vida estava isenta de dor e de tristeza”. Ibid., 4: Eles estavam “revestidos de um corpo sem lhe sentir as fraquezas”.
17. Cartas, III, 17.
18. Homilias sobre as Beatitudes, III, 5. Cf. Discurso catequético, V, 8.
19. Tratado da virgindade, XII, 2.
20. Homilias sobre as Beatitudes, III, 5.
21. Ibid.
22. Questões a Thalassios, 21, PG 90, 312 B.
23. Ibid. 42, PG 90, 408 C.
24. Cf. S. ATANÁSIO DE ALEXANDRIA, Contra os pagãos 2 e 3. S. BASÍLIO, Homilia: Deus não é a causa dos males, 7, PG 31, 344 C (Deus havia concedido a Adão “o gozo da vida eterna”). S. GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, V, 6 {“Sendo igualmente a eternidade uma das vantagens ligadas à natureza divina, impunha-se, pois, como necessário que a organização da nossa natureza não fosse também deserdada neste ponto, mas que possuísse em si mesma o princípio da imortalidade (to athanaton)”}; ibid., V, 8 (a eternidade é colocada, a par da ausência de sofrimento físico, entre os atributos do Adão original); ibid, VIII, 4-5 (a condição mortal estava originalmente reservada às criaturas provadas de razão); A Criação do homem: IV, PG 44, 136 D, XVII, 188 D (a imortalidade figurava entre as qualidades que o homem possuía no momento da sua criação); Tratado da virgindade, XII, 2 (“O homem não tinha por si próprio como propriedade essencial da sua natrueza a capacidade […] de morrer”). S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 12 (“Deus fez o homem [...] imortal”). S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilias sobre as estátuas, XI, 2 (no paraíso, o corpo “não estava submetido à morte”).
25. De Genesi ad litteram, VI, 25, PL 34, 354.
26. Sobre a Encarnação do Verbo, IV, 6. Cf. ibid., 4.
27. Ibid., V, 1.
28. Homilias sobre o Gênesis, XVII, 7.
29. É a expressão de Sb. 2, 23 citada por S. ATANÁSIO DE ALEXANDRIA, Sobre a Encarnação do Verbo, V, 2.
30. S. GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, VIII, 5; Homilias sobre as Beatitudes, III, 5.
31. Cf. S, GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, V, 6. S. ATANÁSIO DE ALEXANDRIA, Contra os pagãos, 2. S. GREGÓRIO PALAMAS, Capítulos físicos, teológicos, éticos e práticos, 47.
32. Cf. S. ATANÁSIO, Sobre a Encarnação do Verbo, III, 4. S. MÁXIMO, Ambigua, 10, PG 91, 1156 D.
33. Ver, por exemplo, S. GREGÓRIO PALAMAS, Homilias, LVII, Ed. Oikonomos, p. 213.
34. Homilias, XXXVI, PG 151, 452 A.
35. Grandes Regras, 55.
36. Cf. S. BASÍLIO, Homilia: Deus não é a causa dos males, 7, PG 31, 344 C. S. MÁXIMO O CONFESSOR, Comentário ao Pai-Nosso, PG 90, 904 C; Questões a Thalassios, Introdução, PG 90, 252 D. S. GREGÓRIO PALAMAS, Capítulos físicos, teológicos, éticos e práticos, 46; Homilias, XXXVI, PG 151, 452 A; Homilias, LIV, Ed. Oikonomos, p. 213.
37. De Genesi ad litteram, VI, 25, PL 34, 354.
38. Contra os pagãos, 2.
39. Sobre a Encarnação do Verbo, V, 1.
40. Ibid., V, 2.
41. Cf. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 11 e 30. S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilias sobre o Gênesis, XVI, 1. S. GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, VIII, 4.
42. Cf. S. GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, V, 9.
43. Cf. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 11.
44. Cf. S. TEÓFILO DE ANTIOQUIA: “Deus transportou [o homem] da terra, de que era feito, para o paraíso” (A Autolyco, II, 24). S. JOÃO CRISÓSTOMO: Deus “tinha criado [o homem] fora do paraíso, mas fê-lo entrar nele imediatamente” (Homilias sobre o Gênesis, XIII, 4).
45. Ver por exemplo S. MÁXIMO, Ambigua, 41, PG 91, 1305 A e D.
46. Cf. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 11.
47. Cf. Ambigua, 45, PG 91, 1353 A.
48. Cf. S. GREGÓRIO DE NISSA, Discurso catequético, V, 9.
49. Cf. S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilias sobre o Gênesis, XVI, 1.
50. S. MÁXIMO, Ambigua, 45, PG 91, 1353 AB: “o primeiro homem estava nu, não que não tivesse carne nem ossos, mas enquanto não tinha esta constituição mais espessa que torna a carne mortal e dura.” Para a concepção de S. Gregório de Nissa, consultar J. DANIÉLOU, Platonisme et théologie mystique. Doctrine spirituelle de saint Grégoire de Nysse, Paris 1944, p. 56-59.
51. S. TEÓFILO DE ANTIOQUIA, A Autolyco, II, 26. S. BASÍLIO, Sobre a origem do homem, II, 7. S. GREGÓRIO DE NISSA, A Criação do homem, Questões a Thalassios, 61, 669 A. A concepção que os Padres têm da origem do homem difere radicalmente, como se vè, da da ciência atual. Do ponto de vista da tradição, a história do homem, tal como a concebe a palentologia humana, não passa da história da humanidade privada da condição paradisíaca. Os Padres veriam no homo habilis um representante da humanidade, não tal como ela saiu das mãos de edus, mas já decaída de seu estado original, no mais baixo grau da sua “involução”, e começando a desenvolver-se segundo uma nova modalidade de existência (há pois que evitar confundir o estado de infância espiritual que os Padres atribuem a Adão na altura da sua criação – cf. STO. IRENEU, Conttra as heresias, IV, 38,1; S. TEÓFILO DE ANTIOQUIA, A Autolyco, II, 25; S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 11 – com uma “infância” histórica ou um estado de subdesenvolvimento da humanidade nascente). A condição original do homem, tal como a apresentam a Sagrada Escritura e os Padres, tem a ver com uma outra temporalidade que não a do conhecimento histórico: ela não pertence ao tempo das realidades sensíveis (Khronos), mas à esfera das realidades espirituais (aiôn), a qual escapa à ciência histórica por revelar tão-só da história espiritual. Sem ser intemporal (pois teve um começo no tempo e era chamada a conhecer um desenvolvimento durável que, aliás, inaugurou), a existência humana que se seguirá à parusia será pós-histórica. A história espiritual não pode, pois, ser “ultrapassada” pela ciência histórica. O ensino da Tradição sobre a origem do homem não é nem mais nem menos incomparável com os dados atuais da palentologia humana do que a transformação eucarística do pão e do vinho no corpo e sangue de Cristo o é com os dados da química, ou a fé no nascimento virginal de Cristo ou na ressurreição dos mortos ou, ainda, na Ascensão de Cristo com os dados da física e da astronomia. Em todos estes casos estamos perante dois modos de apreensão diferentes de ser ou de devir; e a fé e o conhecimento espiritual correspondem a um domínio em que “as leis da natureza são transcendidas”, a um modo de existência propriamente sobre-natural.
52. Cf. S. ATANÁSIO DE ALEXANDRIA, Sobre a Encarnação do Verbo, III, 4. S. MÁXIMO, Questões a Thalassios, 61, PG 90, 632 B. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 30.
53. Cf. Sb. 6, 18: “Obedecer às suas leis é a garantia da incorruptibilidade”.
54. Os Padres sublinham, a este respeito, quer a responsabilidade do homem, ligada ao seu livre-arbítrio (o qual condiciona uma adesão voluntária a Deus), quer a solicitude de Deus que quer, não a morte do homem, mas a sua imortalidade. Ver S. ATANÁSIO, Sobre a Encarnação do Verbo, III, 4-5; IV, 4. S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilias sobre o Gênesis, XVII, 3. S. GREGÓRIO PALAMAS, Capítulos físicos, teológicos, éticos e práticos, 47; Homilias, XXXI, PG 151, 388 D.
55. Homilias, LVII, Ed. Oikonomos, p. 213. Cf. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 11.
56. A Autolyco, II, 27. Cf. I, 24: “O homem foi estabelecido numa situação intermediária, nem completamente mortal, nem absolutamente imortal, mas capaz de ambas”.
57. De Genesi ad litteram, VI, 25, PL 34, 354.
58. Sobre a Encarnação do Verbo, III, 4. S. JOÃO DAMASCENO, A fé ortodoxa, II, 30.
59. Homilias, XXXI, PG 151, 388 D. Cf. Homilias, LIV, Ed. Oikonomoms, p. 213; Capítulos físicos, teológicos, éticos e práticos, 51.
60. Homilias, XXXI, PG 151, 388 D, e Homilias, XXIX, PG 151, 369 C. Cf. S. JOÃO CRISÓSTOMO, Homilias sobre o Gênesis, XVII, 7.
61. Homilias, XXXI, PG 151, 388 D.

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